O Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) negou a revisão criminal pedida pela defesa de uma mulher condenada pela Justiça Federal em 2010 por tráfico de mulheres (na forma qualificada) e formação de quadrilha. A tentativa de reverter a decisão da Justiça Federal envolveu uma suposta sentença absolutória sobre o mesmo fato advinda da justiça suíça. No entanto, o Tribunal entendeu que a defesa não foi capaz de demonstrar a procedência do pedido de revisão criminal.
Os crimes praticados pela condenada a 8 anos e 4 meses de reclusão envolveram o tráfico de mulheres do estado de Goiás. Do Brasil, as mulheres eram enviadas à Suíça para se prostituírem em um bar no país estrangeiro. De acordo com os autos, algumas eram, inclusive, menores de idade.
O relator do processo, juiz federal convocado Saulo Casali Bahia, cujo voto foi acompanhado por unanimidade pela 2ª Seção do Tribunal, argumentou que a defesa alegou, como principal argumento, que havia trânsito em julgado de sentença penal absolutória. A decisão foi relativa aos mesmos fatos pelos quais a mulher teria sido condenada no Brasil, constituindo coisa julgada e, por isso, “fulminando” a competência da justiça brasileira para apreciar a questão, nos termos do art. 7º, inciso II, b, e § 2º, d, do Código Penal (CP).
A revisão criminal foi ajuizada com fundamento no art. 621, incisos I (quando a sentença condenatória for contrária ao texto expresso da lei penal ou à evidência dos autos) e II (quando a sentença condenatória se fundar em depoimentos, exames ou documentos comprovadamente falsos), ambos do Código de Processo Penal (CPP).
O magistrado, ao votar, afirmou que a defesa nada aduziu sobre a existência concreta de depoimentos, exames ou documentos comprovadamente falsos que pudessem dar suporte à revisão criminal, derrubando a hipótese de ser ajuizada pelo art. 621, inciso II do CPP.
Sentença na Suíça – Quanto à hipótese de revisão criminal por sentença contrária à evidência dos autos (art. 621, inciso II do CPP), a defesa tentou demonstrar a existência de uma sentença, supostamente relativa aos mesmos fatos julgados no Brasil, que teria sido prolatada pelo Tribunal Regional de Zurique, na Suíça. E suscitou dúvida sobre a legalidade/constitucionalidade das interceptações telefônicas feitas no caso.
“Relativamente ao primeiro ponto — a existência de coisa julgada em razão da decisão da justiça suíça —, verifica-se que a respectiva sentença penal estrangeira transitou em julgado e se tornou executória em 12/11/2007, ou seja, mais de dois anos antes da sentença objeto do pedido revisional, proferida em 20/01/2010, sem que, contudo, a requerente tenha suscitado eventual litispendência ou coisa julgada nos autos da Ação Penal 0006055-65.2006.4.01.3500/GO, cuja condenação agora busca rescindir”, apontou o relator.
O magistrado também salientou que as cópias da sentença prolatada na Suíça e a respectiva tradução apresentada à Justiça brasileira apresentavam omissões e supressões em vários pontos, impossibilitando aferir se havia, de fato, coisa julgada. “A simples indicação de dispositivos da lei penal suíça e a transcrição das penas impostas à requerente não se mostram suficientes à comprovação de que ambas as ações continham as mesmas partes, causa de pedir e pedido, nos termos do art. 337, § 2º, do Código de Processo Civil”, esclareceu.
Para o relator, seria preciso ainda um quadro comparativo dos fatos do processo penal do Brasil e na Suíça com as duas acusações oficializadas a fim de que a principal tese da revisão pudesse ser examinada com completude. Isso porque não havia elementos seguros acerca da identidade da causa de pedir.
Quanto às interceptações telefônicas, o magistrado firmou ainda que a questão já havia sido “rechaçada na sentença” e que a defesa não apresentou qualquer novo fundamento para revisar o entendimento da Justiça Federal.
Voto-vista – A desembargadora federal Maria do Carmo Cardoso, que pediu vista para melhor analisar a matéria, terminou por também acompanhar o voto do relator. Em primeiro lugar, ela constatou que o Superior Tribunal de Justiça decidiu pela improcedência do pedido de homologação da sentença estrangeira apresentada pela defesa e que, nesse sentido, à Justiça Federal cabe executar a homologação após ter sido originalmente feito no STJ.
A magistrada pontou ainda que embora existam situações em que a sentença estrangeira produz efeitos no Brasil sem a necessidade e homologação do STJ (como para evitar o bis in idem), não foi o caso demonstrado pela defesa, já que a requerente não comprovou a similitude fática e temporal com os crimes pelos quais foi condenada no Brasil.
Processo: 1041052-27.2019.4.01.0000
Data de julgamento: 03/05/2023
AL/CB
TRF1