No caso de ministro de congregação religiosa, mesmo que haja remuneração, pessoalidade no exercício das atividades e respeito à hierarquia da congregação, só deve ser reconhecida a relação de emprego se for provado que existe desvirtuamento da finalidade religiosa e voluntária. Com esse argumento, a Terceira Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região (TRT-10) manteve sentença que negou a existência de vínculo de emprego entre um pastor e uma entidade religiosa.
O autor da ação diz que começou a trabalhar para a igreja em 2006 como responsável pelo departamento de música, recebendo salário mensal. Ele diz que além de preparar repertórios e arranjos, dava aulas e participava dos cultos. Também conta que exerceu funções pastorais até que, com o advento da pandemia, em 2020, passou a exercer a função de porteiro/recepcionista. Afirmando que teve o contrato rescindido por iniciativa da Igreja, pediu o reconhecimento do vínculo com o pagamento das devidas verbas trabalhistas e rescisórias. Em defesa, a Igreja aponta a incompatibilidade entre o reconhecimento do vínculo com o compromisso ministerial do autor da reclamação, que era reconhecido como pastor na instituição.
O juiz de primeiro grau negou o pedido, salientando na sentença que as tarefas realizadas pelo autor, confirmadas por testemunha, não deixam dúvidas de que a relação entre as partes possuía cunho religioso. O autor recorreu da sentença ao TRT-10, reafirmando a presença dos elementos típicos da relação de emprego, previstos no artigo 3º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
Relator do caso julgado pela 3ª Turma, o desembargador Ricardo Alencar Machado lembrou que o parágrafo 2º do artigo 442 da CLT diz que não existe vínculo empregatício entre entidades religiosas e ministros de confissão religiosa, desde que, conforme o parágrafo 3º do mesmo dispositivo, não haja desvirtuamento da finalidade religiosa e voluntária.
E, de acordo com o relator, no caso, a própria narrativa do autor deixa claro o desempenho de atividades inerentes ao ofício religioso essencialmente prestado no departamento de música, mas também em outras áreas. O autor inclusive diz, na petição inicial, que era figura reconhecida pelos fieis como autoridade eclesiástica, responsável para celebração das liturgias e ritos próprios à sua denominação, asseverou o relator. Além disso, em termo de responsabilidade que assinou, o autor declara assumir suas responsabilidades como ministro do Evangelho de livre e espontânea vontade.
O fato de receber remuneração de férias ou mesmo a título de gratificação natalina não desvirtua a finalidade pastoral, se isso ficou convencionado entre as partes, o mesmo acontecendo com relação à contribuição para o regime geral de Previdência Social. Explicou o relator.
“O cenário é conclusivo pelo exercício de funções essencialmente sacerdotais, voltadas à área de música, jamais ultrapassando o ofício religioso”, salientou o desembargador Ricardo Alencar Machado, que reforçou seu argumento revelando que o vínculo entre as partes foi rompido por motivo de discordância com a linha litúrgica adotada pela instituição a partir de determinado momento.
Assim, em se tratando de ministro de congregação religiosa, o fato de receber remuneração, de haver pessoalidade no exercício das atividades e respeito à hierarquia da congregação, por si só, não é suficiente a ensejar o reconhecimento da relação de emprego, fazendo-se necessária a prova do desvirtuamento da finalidade religiosa e voluntária, o que não veio robustamente demonstrado nos autos, concluiu o relator ao negar provimento ao recurso.
A decisão foi unânime.
Processo n. 0000083-94.2023.5.10.0102
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TRT10