A 7ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) manteve, por unanimidade, decisão que negou pedido de homem para anular registro civil de duas crianças que foram criadas por ele até os 11 anos de idade do mais velho. O colegiado reconheceu a relação paterno-filial a partir da vinculação socioafetiva como modalidade de filiação.
Na ação, o autor pediu a desconstituição do vínculo de filiação e a retificação do registro civil do menino e da menina. Informou que é pai registral de ambos, pois conviveu em união estável com a mãe deles por cinco anos. Afirma que a mulher engravidou quando ainda conviviam em família, por isso presumiu que era o pai dos menores. No entanto, quando se separaram, descobriu que a ex-companheira mantinha relacionamento extraconjugal e passou a duvidar da paternidade dos filhos. Com a realização do exame de DNA, em 2016, confirmou suas suspeitas. Destaca que não houve desenvolvimento e fortalecimento de vínculos afetivos com os menores, portanto, não haveria paternidade socioafetiva.
O Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) apresentou parecer pela improcedência dos pedidos e pela manutenção da paternidade no registro de nascimento dos menores. Uma vez que o autor faleceu no curso do processo e é representado pelos demais filhos, solicitou a alteração da certidão de óbito do autor, para que dela conste que os réus Y. e Y. também eram filhos do falecido.
No recurso, os filhos biológicos do autor, representados pelas respectivas mães, que o sucederam após a morte do pai, alegam que o exame de DNA comprova a ausência de vínculo biológico entre o pai e os menores. Informam que o genitor das crianças esteve presente após a separação e preencheu completamente o espaço deixado pelo falecido. Por sua vez, a mãe das crianças afirma que, conforme depoimento das testemunhas, o ex-companheiro sempre soube que não era pai da menina e ainda assim optou por registrá-la como filha. Assim, não se pode afastar a existência da relação socioafetiva.
Na decisão, o Desembargador relator observou que, embora a investigação de paternidade tenha revelado a ausência de vínculo biológico por meio do exame de DNA, a legislação civil e a doutrina brasileira têm reconhecido a configuração da relação paterno-filial a partir da vinculação socioafetiva como modalidade de filiação, caracterizada pela convivência, afetividade e pela estabilidade nas relações familiares. “Presume-se a afetividade quando se verifica a presença de fatos que expressam uma manifestação afetiva, tais como atos de cuidado, de subsistência, de carinho, de educação, de suporte psíquico e emocional, de entreajuda, de comunhão de vida, entre outros”, explicou.
De acordo com o julgador, ficou demonstrado ao longo do processo que o autor dava toda assistência material e tratava as crianças como filhos, mesmo sabendo que não era o pai biológico da menina. Segundo as testemunhas, as crianças eram muito apegadas ao pai e sentiam sua falta. Ficou comprovado, ainda, que a família visitava o autor inclusive no período em que esteve preso.
“Vê-se que a alteração superveniente de sentimentos em relação às crianças, em razão da descoberta de não ser o pai biológico, motivando seu afastamento e o desejo de não mais contatar os requeridos, não tem o condão de afastar o vínculo socioafetivo estável e duradouro já construído pelas partes”, concluiu o magistrado. No entendimento do colegiado está caracterizada a paternidade afetiva, a partir da “presença da afetividade em sua dimensão objetiva, aliada à presença de demonstração de afeto e assistência material ao longo dos anos em que conviveu com a genitora dos infantes”.
Processo segredo de justiça.
TJDFT