A Justiça do Trabalho determinou o pagamento de indenização por dano moral, no valor de R$ 80 mil, à trabalhadora que desenvolveu um transtorno psiquiátrico após o rompimento da barragem da Vale, em Brumadinho, tragédia que completa amanhã seis anos. Perícia médica concluiu que a profissional apresenta um diagnóstico psiquiátrico de estresse pós-traumático relacionado às atividades profissionais exercidas na Mina Córrego do Feijão.
A profissional tinha a função de técnica de segurança do trabalho no local e contou, judicialmente, que, ao saber do acidente, dirigiu-se à barragem, presenciando toda a tragédia. Testemunhas relataram que estavam com ela em uma unidade da empregadora em Nova Lima, a cerca de 20 quilômetros do local do acidente, quando souberam, por telefone, do rompimento. Disseram que foram imediatamente até o local, tendo chegado antes mesmo da polícia e do Corpo de Bombeiros.
Explicaram ainda que foram de carro até onde foi possível, deparando-se com o desastre. “Ela (a técnica de segurança do trabalho) ficou bem desorientada, ela passou bastante mal no local. Tentamos saber notícias dos amigos, dos colegas da gente de trabalho, a gente teve que pegar o carro e levar ela embora porque ela estava sentindo muito mal, estava desorientada no momento”, informou a testemunha.
Para a trabalhadora, foi o destino que fez com que ela não estivesse na barragem no momento do acidente. Segundo a profissional, somente um dos cinco membros da equipe dela sobreviveu à tragédia.
Ao avaliar o caso, o juízo da 4ª Vara do Trabalho de Betim garantiu à trabalhadora uma indenização de R$ 30 mil. Mas a profissional apresentou recurso postulando a majoração do valor arbitrado pelo dano moral.
Recurso
Para a desembargadora relatora da Quarta Turma do TRT-MG, Maria Lúcia Cardoso de Magalhães, o risco de quase morte e a situação de estresse vivida são suficientes para causar o dano moral relatado.
“Embora a reclamante não tenha visto o rompimento da barragem ou tido contato com a lama, não há dúvida de que a presença posterior, na zona atingida pelos rejeitos e com os corpos dos ex-funcionários, é suficiente para ratificar o nexo entre o evento do acidente e a doença que acometeu a autora”, pontuou.
Além disso, no entendimento da magistrada, a vivência da tragédia e as consequências acarretaram o adoecimento da trabalhadora, “consoante concluído pela perícia médica realizada nos autos e esclarecimentos prestados, restando caracterizada a doença ocupacional”. Segundo a julgadora, a própria preposta da empresa e uma testemunha confirmaram as declarações da técnica de segurança de que ela não consegue chegar mais perto de uma barragem sem passar mal. Pelo depoimento da testemunha, a profissional tentou, posteriormente, aproximar-se da barragem da Usina de Candonga, na Zona da Mata mineira, mas não conseguiu, tendo passado mal. Foi necessário sair do local.
Diante dos fatos, a julgadora entendeu que o valor arbitrado à indenização em primeira instância de R$ 30 mil deve ser majorado para R$ 80 mil. Na decisão, ela considerou a extensão do dano, a natureza pedagógica, o fato de que a indenização deve ser proporcional ao grau da dor suportada pela vítima, a gravidade da conduta do ofensor, o grau de culpa e a situação econômica. Reconheceu ainda que a indenização não deve ser meio de enriquecimento sem causa da trabalhadora ofendida.
“Devemos levar em conta ainda as circunstâncias específicas do caso em exame, sendo o dano moral suportado pelos trabalhadores da Barragem da Mina do Córrego do Feijão de difícil quantificação, por envolver não só a violência do acidente, que abalou toda a sociedade, mas também a dor dos trabalhadores em razão dos óbitos de colegas de trabalho. Isso tudo acrescido do fato de que a profissional passou a ser portadora de doença ocupacional e, ainda, a necessidade de que a indenização seja suficiente para punir o agente e coibir a reiteração do ilícito e, ao mesmo tempo, minorar a dor do empregado, sem causar-lhe o enriquecimento sem causa”, concluiu a magistrada.
A julgadora manteve ainda a decisão de primeira instância que entendeu que as duas empresas rés no processo, a Vale S.A. e a outra contratante, deverão responder de forma solidária pelas parcelas objeto da condenação. Mas negou a indenização por danos materiais solicitada pela trabalhadora. Segundo a desembargadora, a perícia constatou que, embora tenha ocorrido a doença ocupacional, a lesão sofrida não teve o condão de incapacitar a autora no desempenho de qualquer atividade profissional.
Processo
PJe: 0010310-19.2020.5.03.0014 (ROT)
TRT3