Em decisão unânime, nesta terça-feira (7/5), os desembargadores da 3ª Turma da 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Tocantins rejeitaram os pedidos feitos em uma apelação criminal e mantiveram a perda do cargo público do policial penal Wellington Barros Souza, decretada pelo juiz Fábio Costa Gonzaga, da 1ª Vara Criminal de Guaraí, em sentença de novembro de 2023.
O policial penal responde a um processo criminal por ter atirado com uma arma de fogo funcional no portão da unidade prisional de Guaraí, onde trabalhava, em fevereiro de 2021, antes de ser transferido para a Unidade Prisional de Palmas.
A denúncia do Ministério Público tem como base o Estatuto do Desarmamento. A norma considera crime, em seu Art. 15, disparar arma de fogo ou acionar munição em lugar habitado ou próximo, na rua ou em direção a ela, em situação que o tiro não tenha como finalidade a prática de outro crime. A pena prevista é de prisão, entre 2 a 4 anos, além de multa.
Conforme o processo, o policial retornava para o plantão, mas o portão da Unidade Prisional de Guaraí estava fechado. Ele acionou o interfone e após esperar alguns minutos, atirou em direção ao portão. Dois dos três tiros acertaram a viatura oficial estacionada dentro do local.
Durante interrogatório, o policial confirmou ter atirado e justificou que o primeiro tiro teria sido dado “para intimidar um detento que se aproximou, e os demais disparos por defeito na arma”.
A decisão de primeiro grau
No julgamento do caso, o juiz Fábio Costa Gonzaga considerou que o policial violou os deveres funcionais e decretou a perda do cargo, ao apontar que os disparos perfuraram o portão e por sorte não atingiram uma das mais de 100 pessoas no local.
“A atribuição do policial penal é promover a segurança em seu local de trabalho e não insegurança. Tal atitude demonstra um nível de desequilíbrio incompatível com as atribuições do cargo”, afirma o juiz, na sentença mantida pelo Tribunal de Justiça, que afastou o policial cautelarmente da função desde o ano passado.
A pena definitiva também inclui 2 anos e 6 meses de reclusão, em regime aberto. O juiz substituiu a prisão por duas medidas restritivas. Uma, é a prestação de serviço comunitário, por 7 horas semanais, durante todo o tempo da pena, em local também a ser indicado pelo Judiciário.
A outra medida é a limitação de fim de semana, situação em que o policial permanecerá recolhido aos sábados e domingos, durante uma quantia diária de horas, e em local a ser definido pelo Judiciário.
A apelação da defesa
No julgamento no Tribunal de Justiça, a 3ª Turma da 1ª Câmara Criminal analisou um recurso de apelação criminal apresentado pela defesa do policial penal, que pedia a anulação da sentença.
Para a defesa, o juiz decidiu além do que foi pedido pelo Ministério Público, autor da denúncia, ao decretar a perda do cargo público. Para a defesa, só poderia haver a perda do cargo se os tiros tivessem ocorrido “com abuso de poder ou violação ao dever para com a administração”.
Em outro argumento, reclamou que não houve proposta para um ANPP (Acordo de Não Persecução Penal) pelo Ministério Público e pediu a absolvição do policial ao defender que não há provas que embasam a condenação.
Também alegou que por ter havido reparação dos danos e o arrependimento do réu, não haveria mais razões – justa causa – para manter a condenação.
O julgamento dos desembargadores
Na decisão por unanimidade, os desembargadores mantiveram todas as medidas, que incluem multa de 20 dias-multa, cada dia no valor de 1 trigésimo do salário mínimo na época.
Relator da apelação, o desembargador Eurípedes Lamounier afirmou durante a votação que a perda do cargo público é efeito da condenação prevista em lei e deve ser declarada pelo juiz, de modo fundamentado, quando os requisitos para esta medida estiverem presentes no processo, mesmo que o Ministério Público não tenha feito o pedido.
“O artigo 92, I, “a”, do Código Penal estabelece que é efeito da condenação a perda de cargo, função pública ou mandato eletivo, quando aplicada pena privativa de liberdade por tempo igual ou superior a um ano, nos crimes praticados com abuso de poder ou violação de dever para com a Administração Pública, não sendo, contudo, efeito automático, devendo ser motivadamente fundamentado na sentença” – Desembargador Eurípedes Lamounier.
O relator afirmou que não houve “qualquer vício” no julgamento, fundamentado pelo juiz ao não acatar as teses da defesa. Também apontou que o ANPP deve ser resultante da convergência de vontades do acusado e do Ministério Público, e não se trata “de um direito subjetivo do acusado”.
O desembargador também afirmou que as provas do processo – o boletim de ocorrência, laudo pericial e quatro testemunhas que confirmaram os fatos – são harmônicas e suficientes para comprovar a materialidade e a autoria, o que mantém a condenação por disparo de arma de fogo.
O relator também negou a redução da pena apresentada pela defesa. Conforme o desembargador, o juiz “agiu com acerto” ao fixar as penas por considerar a culpabilidade, as circunstâncias do crime e as consequências dele. Segundo o relator, a dosagem está “em perfeita sintonia com o princípio da individualização da pena, da razoabilidade e da discricionariedade do juiz”.
Contra a decisão da Câmara Criminal, a defesa ainda pode recorrer ao próprio Tribunal de Justiça e aos tribunais superiores.
TJTO