Discussão envolve a possibilidade de retroatividade de normas penais mais favoráveis nesses casos.
O Supremo Tribunal Federal (STF) vai analisar se uma pessoa condenada por crime hediondo que seja ré primária no mesmo tipo de crime e tenha cumprido metade da pena pode progredir de regime e ter o benefício do livramento condicional e da saída temporária. Para isso, o Tribunal terá de decidir se é possível aplicar retroativamente a esses casos apenas partes favoráveis de normas que permitem esses benefícios.
Este é o tema tratado no Recurso Extraordinário (RE) 1464013, que teve repercussão geral reconhecida (Tema 1319), ou seja, a tese a ser firmada será aplicada a todos os casos semelhantes em todas as instâncias. O julgamento do mérito ainda não tem data marcada.
A progressão da pena privativa de liberdade é tratada no artigo 112 da Lei de Execução Penal (LEP – Lei 7.210/1984). Com as alterações do Pacote Anticrime (Lei 13.964/2019), o dispositivo passou a prever requisitos mais restritivos para a progressão de regime a condenado por crime hediondo com morte. Se for réu primário, ela pode ocorrer somente a partir da metade do cumprimento da pena, mas a norma veda o livramento condicional.
O caso
O recurso a ser julgado envolve um homem condenado nessa circunstância (condenado por crime hediondo com morte, réu primário e mais de 50% da pena cumprida), atualmente preso no Sistema Prisional de Santa Catarina. A Vara Regional de Execuções Penais de São José aplicou de forma retroativa o Pacote Anticrime para autorizar a progressão de regime, mas vedou a futura concessão dos benefícios de livramento condicional e de saída temporária.
Essa decisão foi mantida pelo Tribunal de Justiça estadual. Por sua vez, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), em habeas corpus apresentado pela Defensoria Pública do Estado de Santa Catarina, garantiu a progressão de regime e também o livramento condicional e a saída temporária.
No RE ao STF, o Ministério Público de Santa Catarina alega que o STJ aplicou de forma retroativa apenas parte da nova norma penal – a que beneficiava o condenado com a progressão de regime, deixando de aplicar a parte que veda o livramento condicional. Para o MP, a decisão, ao combinar partes mais benéficas de leis penais, viola os princípios da separação de Poderes, da legalidade e da retroatividade da lei penal mais benéfica.
Interpretações diversas
Para o ministro Luís Roberto Barroso, presidente do STF e relator do recurso, os direitos envolvidos ultrapassam os interesses das partes. Segundo ele, há, por um lado, conflito entre a segurança jurídica e a separação de Poderes e, de outro lado, a garantia de retroação de leis penais mais benéficas ao condenado.
Barroso observou que o STF já se manifestou em situação semelhante. Em algumas decisões, o Tribunal verificou violações à Constituição, mas também já manteve decisões do STJ que determinavam a incidência apenas da parcela mais benéfica sobre a progressão de regime. “A existência de interpretações diversas sobre a aplicação da lei penal evidencia a relevância jurídica da controvérsia constitucional, assim como a necessidade de uniformização da orientação sobre a matéria”, concluiu.
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