Estabelece normas gerais e parâmetros para a garantia da proteção integral à criança e ao adolescente na condição de orfandade, decorrente da morte de um ou de ambos os pais ou cuidadores primários
O CONSELHO NACIONAL DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE (CONANDA), no uso da atribuição que lhe confere o Art. 2º, incisos I e II, da Lei nº 8.242, de 12 de outubro de 1991) e do disposto no Art. 77, incisos I e II, do Decreto nº 9.579 de 22 de novembro de 2018 e do Art. 76, do Decreto nº 11.473, de 06 de abril de 2023, resolve:
CAPÍTULO I
DISPOSIÇÕES GERAIS
Art. 1º Esta resolução estabelece normas gerais e parâmetros para a garantia da proteção integral à criança e ao adolescente na condição de orfandade, decorrente da morte de um ou de ambos os pais ou cuidadores primários.
Art. 2º A proteção integral à criança e ao adolescente na condição de orfandade implica na articulação da família, da sociedade e do Estado, a fim de se garantir a efetividade e a completude na provisão de cuidados e direitos, sob a primazia do poder público.
Art. 3º O Sistema de Garantia de Direitos da Criança e do Adolescente promoverá, de forma articulada, a proteção integral à criança e ao adolescente na condição de orfandade, unilateral ou bilateral, promovendo medidas de defesa, proteção, promoção, participação infanto-juvenil e controle social participativo, para efetivação de direitos.
Art. 4º Para efeitos desta resolução considera-se:
I – Orfandade: condição social e jurídica em que se encontra a criança ou o adolescente em que um ou mais dos pais faleceram considerando as multiparentalidades ou cuidadores primários, gerando a perda de convívio e o rompimento de vínculos em decorrência de óbito, ensejando atenção e proteção específica, integral do Poder Público conforme às suas necessidades de natureza material, física, mental e emocional;
II – Orfandade unilateral: a condição social e jurídica que se encontra a criança ou o adolescente em que um dos pais, considerando as multiparentalidades, ou cuidadores primários faleceram;
III – Orfandade bilateral: a condição social e jurídica em que se encontra a criança ou adolescente em que ambos os pais, considerando as multiparentalidades, ou cuidadores primários faleceram; e
IV – Cuidadores primários da criança e do adolescente: são aqueles que afiançam seu cuidado e sustento e, mesmo que sem formalização legal ou judicial, responsáveis pela relação de seu convívio protetivo.
CAPÍTULO II
DIREITOS E PRINCÍPIOS
Art. 5º Além de outros dispostos na Constituição Federal, na legislação, e nos tratados dos quais o Brasil é signatário, são direitos das crianças e adolescentes em condição de orfandade:
I – Direito ao luto, à preservação e cultivo de sua ancestralidade e da memória familiar e social;
II – Manutenção ou reconstrução de suas relações afetivas, familiares e comunitárias;
III – Garantia de ser informado e proceder com a escuta e manifestação nos processos decisórios que lhes dizem respeito, inclusive nos serviços de atenção, de cuidado e judicial que lhe são prestados;
Parágrafo único. Para os efeitos do disposto no inciso I do caput, compreende-se o direito à ancestralidade, dentre outras dimensões, como direito ao reconhecimento, ao pertencimento e a valorização das memórias e dos vínculos familiares, comunitários, culturais e sociais que constituem a identidade social da criança e do adolescente.
Art. 6º São princípios aplicáveis aos cuidados com crianças e adolescentes na condição de orfandade no âmbito do sistema de garantia de direitos:
I – O reconhecimento da orfandade em sua expressão social e jurídica de desproteção social, implica em ações de responsabilidade do Estado, da Sociedade e da Família para garantir proteção integral à criança e ao adolescente sob orfandade;
II – Todas as ações deverão ser norteadas pelo princípio da intervenção mínima, conforme dispõe o Art. 100, VII do ECA, de forma que a criança, seus pais, cuidadores principais ou responsáveis legais sejam ouvidos e informados sobre os seus direitos, os motivos e os meios da intervenção;
III – O melhor interesse da criança e do adolescente na condição de orfandade;
IV – A preservação e priorização da convivência da criança e do adolescente com a família de origem, natural ou extensa, compreendida como um grupo de pessoas com laços de consanguinidade, de aliança, de afinidade, de afetividade ou de solidariedade;
V – A garantia da minimização de danos, da não flexibilização de direitos, da disponibilização de atenções de forma justa, respeitando o princípio da intervenção mínima, da não discriminação e do respeito à cultura e aos costumes, nas atenções e nos cuidados da criança e do adolescente na condição de orfandade; e
VI – A coordenação sistêmica, com incidência territorial, intersetorial, interinstitucional e familiar considerando as especificidades dos povos originários, quilombolas, povos e comunidades tradicionais, das ações de promoção, defesa e controle social e participativo de direitos da criança e do adolescente na condição orfandade.
CAPÍTULO III
DA ARTICULAÇÃO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS SETORIAIS NO SISTEMA DE GARANTIA DE DIREITOS
Art. 7º A condição de orfandade, definida nos termos dessa resolução, quando resultar em situação de risco, é suficiente para suscitar a atenção e o cuidado do Sistema de Garantia de Direitos, devendo os poderes públicos conferirem atenção especial e específica a determinadas condições de agravamento de risco e vulnerabilidades, em situação de rua e com deficiência que justificadamente demandem tratamento diferenciado.
§ 1º Sem prejuízo de outras situações, serão objeto de atenção especial as condições de orfandade decorrentes de situações de pandemias, feminicídio, violência policial e urbana e desastres climáticos.
§ 2º A orfandade bilateral ou da mãe, sobretudo na primeira infância ensejará a construção de protocolos intersetoriais e integrados de acompanhamento específicos, de acordo com a necessidade de cada situação.
Art. 8º Compete aos poderes públicos, por meio dos seus órgãos federais, estaduais, municipais e distrital e aos demais órgãos do Sistema de Garantia de Direitos, no âmbito e no limite de suas competências implementar serviços, programas, projetos, benefícios e outras estratégias para a garantia da proteção integral à criança e ao adolescente na condição de orfandade.
Art. 9º Caberá ao Conanda constituir um grupo temático dando continuidade aos trabalhos realizados, que visa realizar reuniões, encontros e articulações necessárias com conselhos de políticas públicas setoriais, órgãos do poder executivo, legislativo e judiciário, visando desenhar e implementar instrumentos de políticas públicas setoriais voltados para a garantia da proteção integral à criança e ao adolescente na condição de orfandade.
Art. 10. O GT deverá fazer articulações especialmente com os órgãos responsáveis pelas políticas públicas de assistência social, saúde, educação, cultura, esporte e lazer visando elaborar normas gerais e diretrizes de Garantia da Proteção Integral à Criança e ao Adolescente na condição de orfandade, que deverá ser aprovado por meio de resolução conjunta entre os respectivos conselhos de políticas públicas.
Parágrafo único. A construção e aprovação das normas gerais e diretrizes de ação deverá ocorrer no prazo de 180 dias podendo ser prorrogado por igual período.
Art. 11. O CONANDA em parceria com a Secretaria Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, do Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania, deverá tomar providências para aprimorar o tema orfandade no Sistema de Informação para a Infância e a Adolescência (SIPIA), com a atualização do conceito utilizado, de modo a garantir Acesso e Extração de Dados sobre Orfandade no SIPIA.
Art. 12. Recomenda-se ao Poder Executivo promover, nos termos do inciso XIV do Art. 3º da Lei nº 14.129, de 29 de março de 2021, a interoperabilidade entre seus sistemas pertinentes.
§ 1º Estabelecer procedimentos para o registro da orfandade de crianças e adolescentes, desde a data da sua ocorrência, possibilitando a produção de dados oficiais regulares.
§ 2º Sem prejuízo do disposto no caput, recomenda-se à Corregedoria Nacional de Justiça do Conselho Nacional de Justiça, em função do disposto no Art. 103-B, § 4º, I, da Constituição Federal, fomentar o compartilhamento dos mesmos dados por comunicação direta entre as serventias notariais e os serviços socioassistenciais municipais.
§ 3º O disposto neste artigo observará o art. 7º, III c.c o art. 11, II, “b” c.c o art. 14, § 3º, da Lei nº 13.709, de 14 de agosto de 2018 – Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais e a legislação específica de proteção da criança e do adolescente, sempre visando seu melhor interesse.
Art. 13. Recomenda- se ao Poder Judiciário facilitar o fluxo de atuação nas ações judiciais relacionadas à guarda, tutela, alimentos, inventário, alvará, benefícios previdenciários, retificação de assento de óbito, direitos trabalhistas pendentes, disponibilidade de documentos para garantia de direitos relativos à orfandade da criança e do adolescente e o Sistema Eletrônico dos Registros Públicos (SERP), compartilhamento de informação, a partir do CPF da criança e do adolescente, entre as políticas públicas, sobre o qual dispõe a Lei nº 14.382, de 27 de junho de 2022, ou outro que venha lhe substituir, com a finalidade de dotar a vigilância socioassistencial, a vigilância em Saúde e outros sistemas pertinentes, a serem definidos por fluxo específico, das informações necessárias sobre o número e a localização das crianças na condição de orfandade, providenciando marcadores específicos em cada base de dados e mecanismos de identificação de alertas nos sistemas de informações que possibilitem a tomada de decisão baseada em dados, visando a integração do atendimento as demandas e necessidades, decorrentes da orfandade de crianças e adolescentes, à produção de fluxos, à elaboração de protocolos intersetoriais e de indicadores que possibilitem o monitoramento, avaliação do atendimento.
Art. 14. Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação.
MARINA DE POL PONIWAS
Presidente do Conselho