Dispõe sobre regras procedimentais para o ressarcimento interfederativo relativo a valores financeiros despendidos decorrentes de ordens judiciais referentes a fornecimento de medicamentos.
A MINISTRA DE ESTADO DA SAÚDE, no uso das atribuições que lhe conferem os incisos I e II do parágrafo único do art. 87 da Constituição, e
Considerando o disposto no art. 19-U da Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990, e o julgado no Recurso Extraordinário 1.366.243, originário do Tema de Repercussão Geral nº 1234, em trâmite no Supremo Tribunal Federal – STF, resolve:
Art. 1º Esta Portaria estabelece regras procedimentais para o ressarcimento interfederativo relativo a valores financeiros despendidos decorrentes de ordens judiciais referentes a fornecimento de medicamentos, conforme parâmetros e critérios fixados nos acordos homologados pelo Supremo Tribunal Federal – STF, no âmbito do Recurso Extraordinário 1.366.243, originário do Tema de Repercussão Geral nº 1234.
CAPÍTULO I
DISPOSIÇÕES GERAIS
Art. 2º Para os fins desta Portaria, entende-se por:
I – Componente Especializado da Assistência Farmacêutica – CEAF: estratégia de acesso a medicamentos no âmbito do SUS, caracterizado pela busca da garantia da integralidade do tratamento medicamentoso, em nível ambulatorial, cujas linhas de cuidado estão definidas em Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas publicados pelo Ministério da Saúde, divididos em três Grupos:
a) Grupo 1: medicamentos sob responsabilidade de financiamento pelo Ministério da Saúde, sendo dividido em:
1. Grupo 1A: medicamentos com aquisição centralizada pelo Ministério da Saúde e fornecidos às secretarias de saúde dos estados e Distrito Federal, sendo delas a responsabilidade pela programação, armazenamento, distribuição e dispensação para tratamento das doenças contempladas no âmbito do Componente Especializado da Assistência Farmacêutica; e
2. Grupo 1B: medicamentos financiados pelo Ministério da Saúde mediante transferência de recursos financeiros para aquisição pelas secretarias de saúde dos estados e Distrito Federal sendo delas a responsabilidade pela programação, armazenamento, distribuição e dispensação para tratamento das doenças contempladas no âmbito do Componente Especializado da Assistência Farmacêutica.
b) Grupo 2: medicamentos sob responsabilidade das secretarias de saúde dos estados e do Distrito Federal pelo financiamento, aquisição, programação, armazenamento, distribuição e dispensação para tratamento das doenças contempladas no âmbito do CEAF; e
c) Grupo 3: medicamentos sob responsabilidade das secretarias de saúde do Distrito Federal e dos municípios para aquisição, programação, armazenamento, distribuição e dispensação e que está estabelecida em ato normativo específico que regulamenta o Componente Básico da Assistência Farmacêutica – CBAF.
II – Componente Básico da Assistência Farmacêutica – CBAF: destina-se à aquisição de medicamentos e insumos, incluindo-se aqueles relacionados a agravos e programas de saúde específicos, no âmbito da Atenção Básica à Saúde;
III – Componente Estratégico da Assistência Farmacêutica – CESAF: destinase ao acesso dos medicamentos e insumos destinados aos agravos com potencial de impacto endêmico e às condições de saúde caracterizadas como doenças negligenciadas, que estão correlacionadas com a precariedade das condições socioeconômicas de um nicho específico da sociedade;
IV – medicamentos incorporados: aqueles aprovados para uso no Sistema Único de Saúde – SUS e incluídos na política pública, previstos em Protocolos e Diretrizes Terapêuticas ou listagem especial ou complementar de medicamentos, inclusive medicamentos off label previstos em protocolo do Ministério da Saúde ou em componente básico da Relação Nacional de Medicamentos Essenciais – RENAME;
V – medicamentos não incorporados: medicamentos registrados na Agência Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA que não integram as listas de medicamentos aprovadas pela disponibilização pelo SUS e não observam os protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas do SUS;
VI – medicamentos sem registro na ANVISA: aqueles que não passaram pelo processo de avaliação e aprovação oficial da ANVISA para serem comercializados no Brasil;
VII – medicamentos oncológicos: medicamentos utilizados como parte do componente do cuidado integral do paciente com câncer, a que faz referência a Lei Federal nº 14.758, de 19 de dezembro de 2023;
VIII – medicamentos oftalmológicos: medicamentos indicados para tratamento ou alívio de doenças oculares; e
IX – ressarcimento interfederativo: procedimento administrativo pelo qual a União, estados, Distrito Federal e municípios efetuam repasse financeiro, de valores despendidos por outro ente federativo que suportou o ônus financeiro decorrente do cumprimento de determinação judicial de fornecimento de medicamento.
Art. 3º O ressarcimento de que trata esta Portaria trata de custeio decorrente de cumprimentos de processos judiciais, pelos entes federativos, relativos ao fornecimento de medicamentos:
I – não incorporados, com registro na ANVISA;
II – incorporados:
a) Grupo 1A do CEAF;
b) Grupo 2 do CEAF;
c) Grupo 3 do CEAF;
d) Grupo 1B do CEAF; e
e) CESAF.
III – incorporados – CBAF, nos seguintes casos:
a) clindamicina 300 mg e rifampicina 300 mg, exclusivamente para tratamento de hidradenite supurativa moderada;
b) insulina humana NPH e insulina humana regular;
c) itens que compõem o Programa Saúde da Mulher, como contraceptivos orais e injetáveis, misoprostol, dispositivo intrauterino – DIU e diafragma; e
d) kit de medicamentos e insumos estratégicos para a Assistência Farmacêutica às unidades da federação atingidas por desastres; e
IV – medicamentos oncológicos, incorporados e não incorporados, com registro na Anvisa.
§ 1º No que se refere ao inciso III, serão ressarcidos, ainda, outros medicamentos que venham a ser incorporados e pactuados para financiamento no CBAF por meio de aquisição centralizada pelo Ministério da Saúde.
§ 2º Os medicamentos que foram judicializados, à época sem registro na ANVISA, serão ressarcidos entre os entes, desde que tenham sido registrados na referida Agência até 19 de setembro de 2024.
Art. 4º O ressarcimento disposto nesta Portaria não abrange:
I – solicitações administrativas relativas a processos judiciais nas quais a União já tenha que pagar por Requisição de Pequeno Valor – RPV ou Precatório;
II – solicitações com desembolsos anteriores ao ano de 2018;
III – produtos de interesse para saúde que não sejam caracterizados como medicamentos pela ANVISA; e
IV – medicamentos sem registro na ANVISA, salvo a exceção constante no § 2º do art. 3º desta Portaria.
CAPÍTULO II
PROCEDIMENTOS PARA O RESSARCIMENTO
Seção I
Ressarcimento a ser realizado pela União
Art. 5º O pedido de ressarcimento será realizado, transitoriamente, via Sistema Eletrônico de Informação – SEI, até que advenha solução tecnológica a ser desenvolvida e implementada pelo Ministério da Saúde para transmissão de conjunto mínimo de dados, com a inclusão de documentos, no que couber.
§ 1º O prazo para desenvolvimento e implementação de solução tecnológica para processamento dos pedidos de ressarcimento será de cento e oitenta dias, contados da data de publicação desta Portaria.
§ 2º Para o desenvolvimento do sistema, as Secretarias de Saúde dos estados, Distrito Federal e municípios enviarão uma proposta para a construção do conjunto mínimo de dados, que será pactuada na Comissão Intergestores Tripartite – CIT.
Art. 6º Para o ressarcimento a ser realizado pela União, os entes deverão apresentar:
I – ofício solicitando o ressarcimento de forma individualizada, em observância aos requisitos desta Portaria, com indicação do percentual pretendido de acordo com o enquadramento, observada a época do custeio, do tipo de medicamento previsto, na forma do art. 3º;
II – prescrição ou relatório médico;
III – informações do processo judicial, principalmente petição inicial e decisão judicial, independente do seu trânsito em julgado;
IV – comprovante de gastos, demonstrado, dentre outros, por meio de:
a) nota fiscal;
b) comprovante de compra ou de depósito;
c) nota de empenho; ou
d) Sistema de Busca de Ativos do Poder Judiciário – SISBAJUD; e
V – comprovante de entrega do medicamento.
§ 1º No que se refere ao inciso IV, se o ente não possuir comprovante de gastos, deverá o gestor apresentar declaração sobre o valor, conforme anexo I, sendo que o cálculo para o ressarcimento será feito com base no Preço Máximo de Venda ao Governo – PMVG, vigente na data do pagamento pela União, desonerado de ICMS.
§ 2º No que se refere ao inciso V, se o ente não possuir comprovante de entrega do medicamento, poderá o gestor apresentar declaração de que houve efetiva entrega, conforme documento anexo II.
§ 3º Para os casos de SISBAJUD, a apresentação do comprovante de entrega é dispensada, mediante declaração do gestor de que o valor bloqueado foi despendido integralmente, conforme anexo III, bem como os documentos constantes nos incisos II e III do art. 6º da presente Portaria.
Art. 7º A análise dos pedidos de ressarcimento, no âmbito do Ministério da Saúde, observará:
I – envio de ofício individualizado, pelo Sistema Eletrônico de Informação – SEI, acompanhado dos documentos listados no artigo 6º, devidamente digitalizados, ao protocolo do Ministério da Saúde, com expresso endereçamento à secretaria competente por cada tipo de medicamento indicado no art. 3º;
II – análise e aprovação pela secretaria respectiva;
III – manifestação da Consultoria Jurídica; e
IV – após cumprimento dos requisitos, o ressarcimento será objeto de publicação de ato especifico para pagamento.
§ 1º Em sendo insuficiente a instrução do pedido, poderá ser solicitada documentação complementar.
§ 2º Em caso de ofício encaminhado de forma não individualizada, bem como, na ausência de resposta no prazo de noventa dias da solicitação de documentação complementar pelo Ministério da Saúde, o processo será arquivado.
§ 3º O prazo de que trata o § 2º poderá ser prorrogável, por igual período, mediante justificativa.
Art. 8º Os pedidos de ressarcimento serão analisados observando-se a ordem cronológica dos protocolos, respeitados os cumprimentos dos requisitos previstos no art 6º.
Art. 9º O ressarcimento da União aos entes federativos observará o valor do tratamento anual definido no Acórdão do STF para fins de fixação de competência e obedecerá aos seguintes percentuais:
I – 100% (cem por cento):
a) medicamento não incorporado, com registro na ANVISA, com valor do tratamento anual igual ou maior que 210 (duzentos e dez) salários-mínimos, vigentes à época do desembolso;
b) medicamento incorporado: Grupo 1A e 1B do CEAF e CESAF; e
c) medicamento incorporado – CBAF, nos casos previstos no inciso III do art. 3º.
II – 65% (sessenta e cinco por cento), para os casos de medicamento não incorporado, com registro na ANVISA, com valor do tratamento anual maior que 7 (sete) salários-mínimos e menor que 210 (duzentos e dez) salários mínimos, vigentes à época do desembolso.
III – 80% (oitenta por cento), para os casos de medicamento para tratamento oncológico com ação ajuizada antes de 10 de junho de 2024.
Parágrafo único. No que se refere ao Grupo 1B do CEAF e ao CBAF, deverá haver ressarcimento pela União apenas em razão de ausência ou insuficiência de financiamento pelo ente federal.
Art. 10. O pedido de ressarcimento deverá ser encaminhado:
I – à Secretaria de Atenção Especializada à Saúde, nos casos de medicamentos oncológicos e oftalmológicos; e
II – à Secretaria de Ciência, Tecnologia e Inovação e do Complexo Econômico-Industrial da Saúde, nos demais casos.
Art. 11. O Ministério da Saúde deverá analisar os pedidos pendentes protocolados entre o exercício de 2018 e a publicação da presente Portaria nº prazo de cento e oitenta dias.
§ 1º Após a conclusão da análise dos pedidos pendentes protocolados entre o exercício de 2018 e a publicação desta Portaria, o prazo para análise do Ministério da Saúde passará a ser de noventa dias, prorrogável por igual período.
§ 2º O prazo previsto no caput poderá ser prorrogado, caso o Ministério da Saúde já tenha efetivado o primeiro ressarcimento aos entes e ainda não tenha concluído a análise dos pedidos pendentes protocolados entre o exercício de 2018 e a publicação desta Portaria. Seção II Ressarcimento em favor da União.
Art. 12. O procedimento de cobrança administrativa em caso de necessidade de restituição de valores aos cofres federais observará a ordem cronológica do dispêndio realizado pelo Ministério da Saúde para o cumprimento da decisão, a partir de 2018.
Art. 13. Nos casos em que a União tenha arcado com 100% (cem por cento) do valor e a pactuação realizada no âmbito do Tema 1.234 no Supremo Tribunal Federal – STF tenha sido firmada de forma distinta, o ressarcimento em seu favor respeitará os seguintes critérios:
I – 35% (trinta e cinto por cento), nos casos de medicamento não incorporado, com registro na ANVISA, com valor do tratamento anual maior que 7 (sete) salários-mínimos e menor que 210 (duzentos e dez) salários mínimos, vigentes à época do desembolso;
II – 20% (vinte por cento), nos casos de medicamento para tratamento oncológico com ação ajuizada antes de 10 de junho de 2024.
Art. 14. O Ministério da Saúde observará, no que cabível, os mesmos critérios desta Portaria para proceder com o pedido de ressarcimento em favor da União. Parágrafo único. Caso o valor devido em favor da União seja superior ao recebido por estado ou município, a diferença poderá ser compensada nos pagamentos seguintes até a quitação integral.
Art. 15. A análise dos processos para avaliação da compensação em favor da União, em virtude do ressarcimento, ficará a cargo do Departamento de Gestão das Demandas em Judicialização na Saúde do Ministério da Saúde. Parágrafo único. O Departamento de Gestão das Demandas em Judicialização deverá individualizar a análise dos processos de ressarcimento em favor da União, observando todo o rol de documentação constante no art. 6º da Portaria.
Art. 16. Após avaliação pelo Departamento de Gestão das Demandas em Judicialização dos valores a serem ressarcidos em favor da União, a deliberação será informada às secretarias competentes do Ministério da Saúde para que haja compensação dos valores a serem ressarcidos entre os entes, previamente à submissão do ato administrativo à Ministra de Estado da Saúde.
Art. 17. Estados e municípios poderão solicitar os números dos processos e os devidos acessos relativos a compensação realizada pelo Ministério da Saúde.
Parágrafo único. Em caso de divergência, estados, municípios e Distrito Federal poderão apresentar requerimento fundamentado ao Departamento de Gestão das Demandas em Judicialização com as informações dos processos, ocasião em que tal órgão procederá com a avaliação do pedido e, em sendo aceita, serão adotadas as providências para o devido ressarcimento no pagamento seguinte.
CAPÍTULO III
DO PAGAMENTO PELA UNIÃO
Art. 18. Os recursos relativos ao ressarcimento previsto nesta Portaria serão transferidos na modalidade fundo a fundo, pelo Fundo Nacional de Saúde aos fundos de saúde dos entes federativos, por meio do Bloco de Manutenção das Ações e Serviços Públicos de Saúde.
Art. 19. Os recursos serão repassados de acordo com a disponibilidade orçamentária do exercício.
Art. 20. Os pagamentos dos ressarcimentos, com pedido posterior à publicação desta Portaria, devem ser realizados em no mínimo 2 anos e, no máximo, 3 anos, a contar de cada requerimento. Parágrafo único. Para os pedidos relativos ao período de 2018 até a data de publicação desta Portaria, o prazo de pagamento será de até 5 anos contados da publicação desta Portaria.
CAPÍTULO IV
DISPOSIÇÕES FINAIS
Art. 21. O ressarcimento de medicamentos não incorporados, com valor do tratamento anual igual ou menor que 7 (sete) salários-mínimos, bem como incorporados do Grupo 2 do CEAF, é de responsabilidade integral dos estados ou, em hipótese diversa, respeitando decisão da Comissão Intergestores Bipartite.
Art. 22. Poderá ser realizada compensação entre os valores despendidos pela União, observados os percentuais estabelecidos no acordão e o disposto na Seção II do Capítulo II desta Portaria.
Art. 23. Para fins de atualização, o ressarcimento dos valores será calculado considerando o Preço Máximo de Venda ao Governo – PMVG, desonerado de ICMS, vigente na data do pagamento a ser realizado pela União.
Art. 24. As ordens judiciais cumpridas por meio do bloqueio de valores ou depósito de quantia serão ressarcidas em montante equivalente ao valor efetivamente despendido pelo ente federativo.
Art. 25. Os pedidos de ressarcimentos formulados com base nesta portaria deverão observar estritamente os percentuais fixados no art.9º, independentemente de teor diverso constante de decisão judicial, ainda que transitada em julgado.
Art. 26. Nos casos em que houve ação judicial entre os entes federativos, relativa aos custeios do fornecimento de medicamento, para fins de ressarcimento administrativo, deverá haver pedido de homologação de acordo judicial visando extinguir a ação com resolução de mérito.
Art. 27. As regras procedimentais, fluxos e prazos para o ressarcimento interfederativo entre os estados e municípios serão objeto de pactuação nas respectivas Comissões Intergestores Bipartite – CIB, para atender às especificidades locais, no prazo de noventa dias a contar da publicação desta Portaria.
Parágrafo único. Na ausência da pactuação mencionada, deverão ser utilizadas, quando cabível, as mesmas regras procedimentais, fluxos e prazos para o ressarcimento previstos nesta Portaria.
Art. 28. O percentual referente ao ressarcimento dos medicamentos para tratamento oncológico, com ação ajuizada após 10 de junho de 2024, será previsto no regulamento da Política Nacional de Prevenção e Controle do Câncer, Lei nº 14.758, de 19 de dezembro de 2023.
Art. 29. Havendo revisão do Acordo firmado no Tema 1234 no âmbito do STF, em razão da volumetria das demandas e das condições de disponibilidade orçamentária, esta Portaria deverá ser revista.
Art. 30. Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação.
NÍSIA TRINDADE LIMA
ANEXO I
(exclusivo para assinantes)
ANEXO II
(exclusivo para assinantes)
ANEXO III
(exclusivo para assinantes)