Milena Cintra de Souza – Advogada Cível e Consumidor. Especialista em Direito Público.
A Associação Brasileira das Empresas Aéreas informou uma queda de 50% na demanda por voos domésticos, comparada a igual período de 2019, além do cancelamento de 85% dos voos internacionais.
Nesse sentido, foi publicada a Medida Provisória 925/2020que propõe duas medidas visando socorrer a aviação civil: a postergação do pagamento das outorgas dos aeroportos concedidos e prazo estendido para reembolso das passagens aos consumidores, sendo essa segunda medida de interesse dos consumidores com passagens aéreas compradas.
Conforme a normal legal já em vigor desde a sua publicação, há previsão de que as empresas aéreas reembolsem integralmente os compradores em até doze meses, contados a partir da data de solicitação do consumidor, tudo no tocante às passagens que tenham sido compradas até o dia 31 de Dezembro de 2020.
Caso o consumidor faça a opção pelo cancelamento da viagem, as regras do serviço contratado incidirão normalmente, inclusive, com cobrança de multa. Diferentemente, caso o consumidor aceite o reembolso em forma de crédito para ser utilizado na compra de passagem futura, estará isento de multa e o crédito poderá ser utilizado no período de 12 meses a contar da data da viagem frustrada, conforme artigo 3º da referida medida provisória.
Para o setor de turismo em geral, conforme outra medida provisória, a de número MP 948/2020, as empresas de turismo ficam dispensadas do reembolso imediato dos serviços cancelados em face da pandemia, com opção de remarcação das reservas, disponibilizar o crédito para uso ou abatimento na compra de outros serviços das mesmas empresas ou, ainda, firmar outra espécie de acordo com o consumidor. Nesses casos, não haverá custo adicional, taxa ou multa ao consumidor, desde que a opção seja feita no prazo de 90 dias, iniciados na data de entrada em vigor da medida (8 de Abril de 2020).
As medidas visam diminuir o impacto dos cancelamentos no setor da aviação civil e turismo em geral e atender o desejo de viagem do consumidor, devendo ser considerada como norte para solução de cada caso, mas sem deixar de observar as normas do Código Civil e Código de Defesa do Consumidor.
Na prática, urge a busca do equilíbrio entre os interesses econômicos das empresas e os direitos dos consumidores, fugindo a situação de anormalidade atual do controle de ambas as partes, cabendo ao julgador a análise minuciosa de cada caso concreto, notadamente no caso de opção pelo cancelamento da viagem e cobranças de penalidades, a fim de evitar abusividade por partes das empresas.
Nesse passo, não se pode deixar de pontuar a discussão jurídica gerada em torno da impossibilidade das medidas provisórias atingirem contratos celebrados anteriormente a elas, nem mesmo se a desistência motivada do consumidor ocorrer após esse diploma urgente, tudo por força da vedação, diante de ato jurídico perfeito, à retroatividade de norma que não seja constitucional originária.
O fato é que as normas de urgência já se encontram em pleno vigore, uma vez caracterizada a prática abusiva no mercado de consumo, cabe ao Poder Judiciário intervir caso a caso a partir da provocação do consumidor, cabendo ao julgador afastar eventual conduta ilegal, dando-se efetividade as normas protetivas do CDC paralelamente às regras de urgência ativadas pelo governo face à pandemia do COVID-19.