Nova ação civil pública contra mineradoras deve ficar na Justiça estadual

Decisão afasta tese de que acordo de reparação integral impede ajuizamento de nova ACP

A turma julgadora da 2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais determinou na terça-feira (14/2) o retorno dos autos de uma ação civil pública contra a Samarco Mineração S.A., a Fundação Renova, a Vale S.A. e a BHP Billiton Brasil Ltda. à instância de origem, a comarca de Mariana. A causa deve prosseguir na Justiça estadual mineira até o julgamento final.

O Ministério Público do Estado de Minas Gerais (MPMG) recorreu contra sentença da juíza Marcela Oliveira Decat de Moura, que julgou extinto o processo, sem resolução do mérito, sob o fundamento de que uma ação civil pública anterior, que resultou em acordo já homologado, tinha as mesmas partes e fazia os mesmos pedidos.

A primeira ação civil pública, ajuizada após a tragédia, visava à reparação integral dos danos causados aos atingidos pelo rompimento da barragem do Fundão, em 2015. Porém, de acordo com o MPMG, as questões não foram totalmente resolvidas, e o acordo previa a possibilidade de as pendências serem objeto de nova ação civil pública, o que ocorreu em 2018.

Outro argumento apresentado pelo MPMG foi que os pedidos eram diferentes. A primeira demanda (0400.15.004335-6) visava à reparação integral dos danos individuais e não incluía a Fundação Renova, criada em 2016.

A segunda (0400.18.005230-2) tinha como foco direitos coletivos, como a reabilitação econômica das comunidades atingidas e a reparação de danos posteriores ao rompimento da barragem, como a perda do tempo útil, o prejuízo ao projeto de vida, a ineficiência dos canais de atendimento da Fundação Renova e o atraso na execução dos programas de reparação.

As empresas defenderam a manutenção da sentença, mas a decisão dos desembargadores Afrânio Vilela, Raimundo Messias Júnior e Maria Inês Souza foi unânime no sentido de cassá-la.

“No caso em análise, a matéria é de natureza eminentemente local, envolvendo aspectos estritamente humanos e econômicos da tragédia, relativa aos danos pessoais havidos na comunidade de atingidos – distritos de Bento Rodrigues, Paracatu de Baixo e demais distritos de Mariana – ao tempo do rompimento da barragem”, disse o desembargador Afrânio Vilela.

O relator destacou que não se modifica competência absoluta, conforme o Art. 62 do Código de Processo Civil, segundo o qual a competência que foi determinada em razão da matéria, da pessoa ou da função não pode ser derrogada por convenção das partes.

O 1º vogal, desembargador Raimundo Messias Júnior, acrescentou que a competência é da Justiça Estadual, pois “a discussão gira em torno do interesse local, envolvendo danos pessoais da comunidade, tais como problemas com locomoção, transporte de suprimentos básicos, pagamento de auxílio, questão das moradias alugadas, ineficácia do atendimento à comunidade, etc.”

A 2ª vogal, desembargadora Maria Inês Souza, acompanhou integralmente os votos dos magistrados que a antecederam.

Após ultrapassar a preliminar de incompetência da Justiça Estadual, a turma julgadora afastou a tese de coisa julgada e determinou o retorno dos autos à origem para que se decidisse se as empresas mineradoras e a Fundação Renova devem ser condenadas pelos danos posteriores ao desastre, que continuam causando prejuízo à população atingida.

Embora as requeridas tenham defendido que os danos foram abarcados no acordo de reparação integral, a tese foi afastada.

“A experiência obtida nos últimos sete anos relatando recursos envolvendo o desastre demonstra que a efetividade do compromisso de reparação integral somente virá por meio de comandos judiciais específicos”, afirmou o relator. O desembargador Afrânio Vilela salientou que isso significa que podem ser ajuizadas quantas ações coletivas e individuais forem necessárias à reparação completa dos danos causados, mesmo porque os danos vêm se desdobrando desde 5 de novembro de 2015, dia do rompimento.

O número do processo é 1.0400.18.005230-2/001.

TJMG

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