Regulamenta a assistência à pessoa egressa de que tratam os art. 10, art. 11, art. 25, art. 26 e art. 27 da Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984, e institui a Política Nacional de Atenção à Pessoa Egressa do Sistema Prisional.
O Presidente da República, no uso das atribuições que lhe confere o art. 84, caput, incisos IV e VI, alínea “a”, da Constituição, e tendo em vista o disposto nos art. 10, art. 11, art. 25, art. 26 e art. 27 da Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984,
DECRETA:
CAPÍTULO I
DISPOSIÇÕES GERAIS
Art. 1º Este Decreto regulamenta a assistência à pessoa egressa de que tratam os art. 10, art. 11, art. 25, art. 26 e art. 27 da Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984, e institui a Política Nacional de Atenção à Pessoa Egressa do Sistema Prisional – PNAPE, de forma articulada com a Política Nacional de Atenção à Pessoa Egressa do Sistema Prisional no âmbito do Poder Judiciário, instituída pela Resolução nº 307, de 17 de dezembro de 2019, do Conselho Nacional de Justiça.
Parágrafo único. A PNAPE estabelecerá os parâmetros para o desenvolvimento de ações, projetos e atividades destinados a garantir os direitos fundamentais e assegurar as medidas assistenciais legais em favor das pessoas egressas do sistema prisional e dos seus familiares.
Art. 2º Para fins do disposto na PNAPE, considera-se:
I – egressa – pessoa que, após qualquer período de permanência no sistema penitenciário, mesmo em caráter provisório, necessite de atendimento no âmbito das políticas públicas, dos serviços sociais ou jurídicos, em decorrência de sua institucionalização;
II – pré-egressa – pessoa que se encontre em cumprimento de pena privativa de liberdade, durante o período de seis meses que antecede a sua soltura da unidade prisional; e
III – serviço especializado de atenção às pessoas egressas e aos seus familiares – serviços, de comparecimento voluntário e não retributivo, ou equipamentos públicos implementados em conformidade com o disposto neste Decreto, voltados à promoção e à garantia de direitos das pessoas egressas e dos seus familiares, dotados de metodologias especializadas na atenção ao público beneficiário.
Art. 3º A PNAPE será implementada pela Secretaria Nacional de Políticas Penais do Ministério da Justiça e Segurança Pública, em regime de cooperação com os demais órgãos da administração pública federal, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios, o Poder Judiciário e a sociedade civil.
§ 1º Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão, mediante adesão formal à PNAPE, atuar em regime de cooperação com a União para a criação de políticas públicas de atenção às pessoas egressas e aos seus familiares, na forma prevista neste Decreto.
§ 2º Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão, com apoio institucional da Secretaria Nacional de Políticas Penais do Ministério da Justiça e Segurança Pública, serviços especializados de atenção às pessoas egressas e aos seus familiares com competência formal para articulação e gestão da PNAPE em suas respectivas esferas administrativas, sem caráter de fiscalização de penas, condicionalidades ou medidas penais.
§ 3º Para a execução da PNAPE poderão ser firmados contratos, convênios, parcerias e acordos, na forma prevista na legislação, com o Poder Judiciário, o Ministério Público, a Defensoria Pública, os órgãos e as entidades da administração pública, os organismos internacionais, as universidades e as instituições de ensino superior, as federações sindicais, os sindicatos, as organizações da sociedade civil e as empresas privadas.
§ 4º Será promovida a articulação e a integração da PNAPE com políticas, programas e projetos congêneres da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.
Art. 4º Às pessoas pré-egressas deverá ser assegurada a participação em programa específico de preparação para a liberdade, realizado durante os últimos seis meses de custódia prisional.
Parágrafo único. Recomenda-se aos órgãos da administração pública estadual e distrital disciplinar e coordenar a execução do programa de que trata o caput junto aos estabelecimentos prisionais dos Estados e do Distrito Federal, em integração às ações, aos projetos e às atividades direcionadas às pessoas egressas e aos seus familiares.
CAPÍTULO II
DAS DIRETRIZES, DOS OBJETIVOS E DOS INSTRUMENTOS
Art. 5º A PNAPE deverá:
I – ser implementada com base no tratamento digno das pessoas egressas e dos seus familiares;
II – considerar a intersetorialidade das políticas públicas, a seletividade do sistema de justiça criminal e os efeitos estigmatizantes da vivência prisional; e
III – respeitar a voluntariedade do comparecimento das pessoas egressas e dos seus familiares aos serviços especializados.
Art. 6º São diretrizes da PNAPE:
I – a articulação intersetorial e interministerial para a promoção da cidadania e da inclusão social das pessoas egressas e dos seus familiares, mediante a integração com as políticas de saúde, educação, trabalho e renda, assistência social, habitação, cultura, mobilidade urbana e promoção dos direitos, considerados os marcadores sociais das diferenças;
II – o reconhecimento de que o atendimento às pessoas egressas e aos seus familiares é responsabilidade pública estatal, compartilhada entre União, Estados, Distrito Federal e Municípios, com participação ativa da sociedade civil e da iniciativa privada; e
III – o fomento à articulação ou ao fortalecimento de redes de apoio às pessoas egressas e aos seus familiares, reconhecida a participação social como direito do cidadão e expressão de sua autonomia.
Art. 7º São objetivos da PNAPE:
I – implementar serviços especializados de atenção às pessoas egressas e aos seus familiares, com metodologias próprias e interligados às redes de serviços públicos;
II – promover a formação de quadros e carreiras de servidores especializados na atenção às pessoas egressas e aos seus familiares;
III – desenvolver estratégias, programas, projetos e ações voltados à garantia dos direitos fundamentais das pessoas egressas e dos seus familiares;
IV – promover o associativismo e o cooperativismo, com ênfase na equidade de gênero e raça;
V – articular estratégias de integração com as demais políticas prisionais, em especial a Política Nacional de Trabalho no âmbito do Sistema Prisional – PNAT, a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde das Pessoas em Privação de Liberdade – PNAISP, a Política Nacional de Atenção às Mulheres em Situação de Privação de Liberdade e Egressas do Sistema Prisional – PNAMPE e as ações relacionadas à emissão de documento de identificação civil; e
VI – desenvolver estratégias de difusão dos direitos das pessoas egressas e dos seus familiares, por meio de campanhas educativas e informativas.
Art. 8º São instrumentos da PNAPE:
I – os planos nacional, estaduais, distrital e municipais de atenção às pessoas egressas e aos seus familiares;
II – as equipes multidisciplinares de profissionais e as metodologias especializadas na atenção às pessoas egressas e aos seus familiares;
III – os planos de formação profissional continuada;
IV – a cooperação técnica e financeira entre os entes federativos e os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário;
V – a previsão orçamentária;
VI – a pesquisa científica;
VII – o fomento à instituição de órgãos colegiados de regulação e fiscalização da PNAPE; e
VIII – a participação social.
CAPÍTULO III
DAS COMPETÊNCIAS
Art. 9º Compete à Secretaria Nacional de Políticas Penais do Ministério da Justiça e Segurança Pública, no âmbito da PNAPE:
I – estimular, em parceria com os demais órgãos e entidades da administração pública federal, a implementação de serviços especializados de atenção às pessoas egressas e aos seus familiares, no âmbito estadual, distrital e municipal;
II – coordenar esforços para a institucionalização da PNAPE nos Estados, no Distrito Federal e nos Municípios, com a previsão de mecanismos de sustentabilidade por meio de convênios, repasses do Fundo Penitenciário Nacional e outras fontes de recursos;
III – fomentar o fortalecimento das redes de atenção às pessoas egressas e aos seus familiares, consideradas as especificidades desse público;
IV – promover, em parceria com os demais órgãos e entidades da administração pública, organizações não governamentais e representantes da sociedade civil, campanhas de conscientização e de informação voltadas à educação e à inclusão produtiva de pessoas egressas;
V – coordenar esforços para elaboração, implementação e regulamentação de mecanismos formais em favor de empresas comprovadamente contratantes de pessoas egressas;
VI – promover a integração entre as redes municipais de fornecimento de serviços em favor da pessoa egressa e as Defensorias Públicas dos Estados, do Distrito Federal e da União; e
VII – coordenar, por meio do Sistema de Informações do Departamento Penitenciário Nacional, ou por meio de sistema próprio para a PNAPE, a integração centralizada de dados e informações relativas às pessoas egressas.
Art. 10. Mediante adesão voluntária e formal à PNAPE, realizada a partir de assinatura de termo pelo Chefe do Poder Executivo ou por seu representante, os Estados e o Distrito Federal aderentes se comprometem concorrentemente a:
I – instituir estruturas organizacionais para gestão e execução da PNAPE no âmbito estadual ou distrital;
II – prestar suporte às pessoas egressas e aos seus familiares, com metodologias específicas e especializadas, integradas à rede de políticas sociais, sem caráter de fiscalização de penas, condicionalidades ou medidas penais;
III – estruturar rede de apoio às pessoas egressas e aos seus familiares, destinada à promoção dos direitos fundamentais;
IV – fomentar, planejar e coordenar as estratégias de mobilização de pessoas pré-egressas, a fim de disseminar a PNAPE junto às pessoas em privação de liberdade;
V – elaborar e estimular o desenvolvimento de estratégias de participação social e comunitária nas etapas de formulação, implementação, execução e avaliação da eficiência da política pública de apoio às pessoas egressas e aos seus familiares;
VI – promover processos de formação continuada dos integrantes das equipes e das redes de atuação parceiras, com o apoio e a participação, na forma prevista na legislação, de integrantes da sociedade civil, das universidades, das instituições de ensino superior e da iniciativa privada;
VII – promover, com apoio institucional dos órgãos integrantes do Sistema de Justiça, campanhas de comunicação voltadas à informação da população quanto ao modo de execução e à conscientização da população quanto aos benefícios advindos da política de atenção às pessoas egressas e aos seus familiares; e
VIII – garantir a gestão adequada da informação sobre os atendimentos prestados e os serviços fornecidos à população beneficiária, respeitados os princípios da Lei nº 13.709, de 14 de agosto de 2018.
Art. 11. Mediante adesão voluntária e formal à PNAPE, realizada a partir de assinatura de termo pelo Chefe do Poder Executivo ou por seu representante, os Municípios aderentes se comprometem concorrentemente a:
I – instituir estruturas organizacionais para execução da política de atenção à pessoa egressa e aos seus familiares no âmbito municipal, com metodologias específicas e especializadas, em articulação com a política estadual e distrital de atenção à pessoa egressa e aos seus familiares, integradas à rede de políticas sociais, sem caráter de fiscalização de penas, condicionalidades ou medidas penais;
II – manter a articulação institucional necessária com os órgãos responsáveis pela administração penitenciária, com os órgãos executores da política de atenção às pessoas egressas e aos seus familiares e com as redes de políticas sociais para o desenvolvimento de ações, projetos e estratégias da PNAPE;
III – desenvolver políticas de combate à discriminação das pessoas egressas e dos seus familiares;
IV – capacitar os agentes públicos integrantes da rede de serviços municipais acerca das particularidades do atendimento às pessoas egressas e aos seus familiares;
V – instituir fundos municipais de políticas penais, para prover recursos e assegurar a sustentabilidade dos serviços especializados;
VI – garantir o acesso das pessoas egressas aos serviços municipais de acolhimento, com o fornecimento dos itens de assistência material básica correspondentes;
VII – assegurar às pessoas egressas o acesso à informação, em linguagem clara e simples, sobre os direitos e os serviços públicos legalmente assegurados em seu favor;
VIII – ampliar as políticas para atendimento das especificidades do público feminino que esteja em situação de prisão ou de egressão do sistema prisional; e
IX – criar programas de trabalho, de geração de renda e de inclusão de pessoas egressas no mercado de trabalho, mediante o desenvolvimento de políticas específicas, com o apoio da sociedade civil organizada e da iniciativa privada, na forma prevista na legislação.
CAPÍTULO IV
DISPOSIÇÕES FINAIS
Art. 12. Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 21 de dezembro de 2023; 202º da Independência e 135º da República.
LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
Flávio Dino de Castro e Costa