Em decisão unânime tomada no final de 2023, a Terceira Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região (TRT-10) negou recurso contra sentença de primeiro grau que considerou válido o programa para Trainees da Magazine Luiza S/A voltado exclusivamente para negros. Para o colegiado, a iniciativa representa uma ação afirmativa que busca alcançar uma parcela da população que é historicamente discriminada, e a jurisprudência predominante autoriza a adoção desse tipo de política por parte de empresas privadas.
Consta dos autos que a empresa criou um programa para trainees, com 12 meses de duração, voltado exclusivamente para pessoas negras. A Defensoria Pública da União no Distrito Federal (1ª categoria) acionou o Poder Judiciário contra a iniciativa, alegando que o direcionamento do programa apenas para negros, além de não configurar uma ação afirmativa, afrontaria o Estatuto da Desigualdade Racial (Le 12.288/2010). A ação foi julgada improcedente pelo juízo de primeiro, o que levou a DPU a recorrer ao TRT-10.
No julgamento do caso na Terceira Turma, o relator do caso, desembargador Pedro Luís Vicentin Foltran, salientou que o estatuto citado pelo autor da ação, na verdade, incentiva a adoção de ações afirmativas para aumentar a participação da população negra. O artigo 4º da norma, revelou, prevê a implementação de programas de ação afirmativa destinados ao enfrentamento das desigualdades étnicas no tocante à educação, cultura, esporte e lazer, saúde, segurança, trabalho, moradia, meios de comunicação de massa, financiamentos públicos, acesso à terra, à Justiça, e outros.
O relator lembrou, ainda, que a jurisprudência dominante no Judiciário entende ser legal a adoção de ações afirmativas por parte do setor privado. Eliminação da discriminação De acordo com a Convenção para Eliminação da Discriminação Racial da Organização das Nações Unidas (ONU), ratificada no Brasil pelo Decreto nº 65.810 de dezembro de 1969, frisou o relator, discriminação racial é qualquer distinção, exclusão, restrição ou preferência baseada em raça, cor, descendência ou origem nacional ou étnica que objetiva eliminar ou limitar o reconhecimento ou o exercício, em igualdade de condições, de direitos humanos e liberdades fundamentais no domínio político econômico, social, cultural ou em qualquer outro domínio de vida pública.
Esta mesma norma, prosseguiu o desembargador Pedro Foltran, aponta que quaisquer providências especiais que sejam adotadas com a finalidade de garantir melhorias e para assegurar a referidos grupos ou indivíduos igual gozo ou exercício de direitos humanos e liberdades fundamentais, não serão consideradas discriminação racial, desde que tais medidas não levem à preservação de direitos diferentes para grupos raciais distintos e não continuem após terem sidos atingidos os seus objetivos.
Censo
Ainda de acordo com o relator, o último censo do IBGE traz informações que demonstram as desigualdades que precisam ser enfrentadas. Os dados apontam, entre outros, que a renda média do trabalhador branco é 75% maior do que a de negros, que os brancos são menos afetados pelo desemprego e pela informalidade, e que entre pessoas com curso superior, o rendimento médio das pessoas brancas, por hora, foi 50% superior ao de negros e 40% superior ao de pardos.
Por reconhecer a legalidade da iniciativa, o relator votou no sentido de reconhecer que a adoção de Programa Trainee por empresa privada exclusivamente para pessoas negras, com duração de 12 meses ou mais, é sim uma ação afirmativa voltada para um grupo historicamente discriminado, “já que infelizmente ainda está muito distante, no Brasil, atingir o objetivo das medidas afirmativas em benefício da população negra que seria a igualdade salarial, independentemente, da cor da pele do trabalhador contratado”.
Processo n. 0000790-37.2020.5.10.0015
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