A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que o credor de adiantamento de contrato de câmbio não precisa esperar o pagamento dos demais créditos submetidos aos efeitos da recuperação judicial para receber os valores que lhe são devidos.
O caso analisado pelo colegiado diz respeito à execução movida contra uma empresa em recuperação devido a débito resultante de adiantamento de contrato de câmbio. O credor requereu a penhora de valores no rosto dos autos da recuperação judicial e a suspensão da expedição de alvarás para pagamento dos credores habilitados no processo de soerguimento.
O juízo da recuperação determinou a transferência dos valores penhorados para o juízo da execução, com fundamento na natureza do crédito. No entanto, o tribunal de segundo grau entendeu que a transferência desses valores, enquanto ainda houvesse credores habilitados na recuperação, significaria ignorar o plano recuperacional e frustrar o próprio processo.
No recurso ao STJ, o credor sustentou que o crédito decorrente de adiantamento de contrato de câmbio não se submete à recuperação judicial.
Produto da exportação pertence ao banco que fez o adiantamento
O relator na Terceira Turma, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, afirmou que os valores entregues ao devedor em razão de adiantamento de contrato de câmbio para exportação não se submetem aos efeitos da recuperação, conforme o artigo 49, parágrafo 4ª, da Lei 11.101/2005.
Segundo ele, nessa operação, os recursos são adiantados em moeda nacional para o exportador, “por conta de uma exportação a ser realizada no futuro, metodologia muito valorizada pelo comércio exterior, pois incentiva as exportações, permitindo aos exportadores que obtenham financiamento antecipado, com a redução dos riscos cambiais e a melhora de fluxo de caixa”.
Desse modo – ressaltou o relator –, o produto da exportação não faz parte do patrimônio da empresa exportadora em recuperação, a qual recebeu a antecipação de valores, mas sim da instituição financeira que concedeu o adiantamento.
O ministro explicou que “a opção do legislador em não submeter esses créditos aos efeitos da recuperação judicial teve como objetivo proteger as exportações, incentivando as instituições financeiras a continuar concedendo antecipação de crédito aos interessados”.
Devolução dos valores pode ser requerida diretamente ao juízo da recuperação
Villas Bôas Cueva comentou que, diferentemente do que acontece na falência, a expectativa na recuperação é que o devedor consiga pagar todos os credores, a partir das condições e dos prazos especiais que são fixados. Assim, o plano judicial deve demonstrar a capacidade da empresa de quitar todas as dívidas e continuar atuando no mercado.
No caso em julgamento, porém, o ministro disse que a decisão de segunda instância se baseou em uma ideia equivocada de que alguns credores deveriam receber antes de outros, “a partir de uma ordem de pagamento que não está na lei”.
Conforme destacou, “os créditos que não estão submetidos aos efeitos da recuperação judicial podem ser perseguidos pelos credores, sem modificação no montante devido e no vencimento”.
O relator indicou que, para a jurisprudência do STJ, o credor pode requerer diretamente ao juízo da recuperação a devolução dos valores do adiantamento de contrato de câmbio. “Não há como postergar o pagamento do credor do adiantamento de contrato de câmbio para após o encerramento da recuperação judicial”, afirmou.
De acordo com Cueva, “a frustração do processo de soerguimento ocorre com o não pagamento dos créditos, estejam ou não submetidos aos efeitos da recuperação, pois em qualquer dos casos poderá ser requerida a falência do devedor. Além disso, os créditos não submetidos aos efeitos da recuperação judicial não precisam ser habilitados, o que, porém, não autoriza que sejam preteridos”.
Processo: REsp 2.070.288.
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