Descartado o direito do espólio de pleitear indenização por danos morais e existenciais sofridos por trabalhador falecido em Brumadinho

A Justiça do Trabalho negou o pedido de indenização por danos morais e existenciais feito pelo espólio de trabalhador falecido em decorrência do rompimento da barragem de rejeitos da Mina Córrego do Feijão, em Brumadinho/MG. A sentença é da juíza Renata Batista Pinto Coelho Froes Aguiar, titular da 1ª Vara do Trabalho de Betim.

A juíza reconheceu a responsabilidade e a culpa da mineradora Vale pela tragédia que tirou a vida do trabalhador. Entretanto, foi descartado o direito do espólio de pleitear indenização por danos morais experimentados diretamente pelo falecido. Na sentença, foi esclarecido que o espólio é um conjunto de bens, direitos e obrigações da pessoa falecida, adquiridos antes do falecimento e transmitidos aos herdeiros. Com a morte do trabalhador, cessou a existência de sua personalidade. Dessa forma, não cabe falar em danos morais experimentados diretamente pelo falecido em decorrência da tragédia e que teriam sido transmitidos aos herdeiros.

Mas, conforme ressaltou a juíza, nada impede que os familiares interponham, em nome próprio, ação com pedido de indenização por danos morais a cargo da empresa, por eventual sofrimento decorrente da morte do ente querido na tragédia de Brumadinho. No caso, os prejuízos morais que dariam respaldo à indenização seriam concretizados na pessoa do próprio familiar e não do trabalhador falecido.

Para reforçar o entendimento adotado na sentença, a magistrada citou os ensinamentos do jurista e desembargador do Tribunal Regional do Trabalho de Minas Gerais (TRT-MG), Sebastião Geraldo de Oliveira:

“Se ocorrer a morte imediata, não há falar em transmissão do direito de acionar o causador do dano moral, porque a vítima não sobreviveu ao acidente de modo a experimentar pessoalmente todas as agruras oriundas do infortúnio. Na hipótese, os familiares, dependentes ou os que se sentiram de algum modo lesados poderão intentar ação jure próprio, com o propósito de obter a reparação do dano moral. Não agirão na condição de sucessores da vítima, mas como autores, em nome próprio, buscando a indenização cabível.

(…) O possível valor da indenização não chegou a compor o patrimônio do acidentado morto e, portanto, não faz parte da herança a ser inventariada e repartida aos herdeiros. Nessa hipótese, vale repetir, os titulares do direito à indenização pelos danos morais devem ingressar em juízo em nome próprio e não como sucessores do morto…” in Indenizações por Acidente do Trabalho ou Doença Ocupacional, 4ª edição revista e ampliada, Editora Ltr, São Paulo, 2008, página 267.

Também houve referência à doutrina de José Affonso Dallegrave Neto:

“No caso do acidentado falecer por decorrência de acidente ou doença ocupacional, poderão ingressar com ação de dano moral todos aqueles que mantinham laço afetivo com o de cujus. Repare que aqui os demandantes agirão em nome próprio e não em substituição à dor do acidentado…” in Responsabilidade Civil no Direito do Trabalho, 3ª edição, Editora Ltr, São Paulo, 2008, página 348).

A julgadora destacou que o direito do espólio é restrito às ações que versem sobre direitos transmissíveis, abrangendo, assim, aqueles de natureza hereditária, entre os quais não se enquadra o direito a indenização por danos morais e existenciais em virtude da morte do empregado, tendo em vista que “com esse evento, cessa o direito de personalidade”.

“A partir do evento morte, passam a ter direito a indenização apenas aqueles que tenham sido lesados pelo falecimento, entre eles os familiares, e não o falecido diretamente ou seu espólio”, frisou a juíza, referindo-se, inclusive, à jurisprudência do TRT-MG sobre a matéria:

“ESPÓLIO. PEDIDO DE PENSÃO VITALÍCIA E DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. A herança nada mais é do que uma universalidade de bens, a qual é representada ativa e passivamente pelo inventariante, conforme artigo 12 do CPC. Não possui personalidade própria, nem constitui uma pessoa jurídica. Por ter uma existência efêmera e transitória, e por ser destituído de sentimentos de dor, de alegria, de tristeza etc., não tem direito ao pagamento de pensão vitalícia nem de indenização por dano moral”. (TRT da 3ª Região; Pje: 0010305-67.2015.5.03.0112 (RO); Disponibilização: 19/05/2016, DEJT / TRT3 / Cad.Jud, Página 465; Órgão Julgador: Nona Turma; Relator: Mônica Sette Lopes).

Por essas razões, foram julgados improcedentes os pedidos de indenizações por danos morais e existenciais. Em grau de recurso, os julgadores da Sexta Turma do TRT-MG, em decisão unânime, declararam, de ofício, a ilegitimidade ativa do espólio autor, a teor do artigo 337, parágrafo 5º combinado com inciso XI, do CPC, e declararam extinto o processo, sem julgamento da questão central, nos termos do artigo 485, inciso VI, também do CPC. Atualmente, o processo aguarda, no TRT-MG, decisão de admissibilidade do recurso de revista.

Processo

  •  PJe: 0010688-02.2021.5.03.0026 (ROT)

TRT3

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