Justiça estadual garante redução de jornada de trabalho sem corte salarial para pai de criança com autismo

Em decisão nesta quinta-feira (16/1), o juiz Jean Fernandes Barbosa de Castro, da 1ª Vara Cível de Taguatinga, concedeu a um professor da rede pública municipal de Taguatinga o direito de reduzir sua jornada de trabalho em 50% para acompanhar o tratamento do filho diagnosticado com Transtorno do Espectro Autista (TEA), sem que haja qualquer perda salarial.

O juiz baseou sua sentença no Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero, estabelecido pela Resolução 492, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), e em jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos. A sentença reconheceu o direito líquido e certo do professor, respaldado pela Lei Municipal de nº 404, de 2011, e pelo Decreto Municipal de nº 565, de 2020, que garantem horário especial para servidores(as) com dependentes com deficiência.

O servidor entrou com a ação judicial – um Mandado de Segurança – após uma decisão da Secretaria Municipal de Administração negar seu pedido de redução da jornada de trabalho. Para a Justiça, o professor informou que seu filho, de três anos, necessita de acompanhamento terapêutico semanal na cidade de Luís Eduardo Magalhães, na Bahia. O município tocantinense onde reside não oferece tratamento adequado para o autismo.

Na sentença, o juiz destaca o princípio da dignidade da pessoa humana e o da proteção integral e melhor interesse da criança, ambos previstos na Constituição Federal e no Estatuto da Criança e do Adolescente.

“Tenho por abusiva a conduta do impetrado (município de Taguatinga) ao deixar de efetivar a redução da carga horária em termos práticos, além de implicar em perca salarial quando a legislação admite a redução da jornada sem efeitos financeiros, configurando possível discriminação por motivo de deficiência”, escreve o juiz, na sentença.

Ao basear a decisão no Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero, que visa combater estereótipos e discriminações, o juiz Jean Fernandes ressaltou a importância de se considerar as particularidades de cada caso, especialmente quando se trata de grupos minoritários e vulneráveis, como as pessoas com autismo.

“Não se pode criar qualquer estereótipo baseado em gênero, raça, etnia ou qualquer forma de apresentação diferenciada por conta de TEA. Ao contrário, é preciso que a Administração Pública conduza a sua atuação voltada para casos que envolvem minorias no aspecto qualitativo ou quantitativo, buscando padrões normativos de justiça que possam tutelar os seus direitos de forma mais eficaz’, afirma o juiz Jean Fernandes Barbosa de Castro.

A sentença cita ainda a Convenção sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência, que define como discriminação a recusa à adaptação razoável, e a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, que garante medidas de proteção às crianças. A sentença cita o Caso Furlan e familiares, na Argentina, julgado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, no qual prevaleceu a importância do modelo social de deficiência e da adoção de medidas positivas para a inclusão social.

O juiz também afirma em sua decisão que “a severidade ou indiferença no tratamento de questões identitárias de grupos vulneráveis, reforça um padrão comportamental voltado para tutelas ordinárias que não devem prevalecer frente a demandas com perspectivas outras não segmentadas pelo núcleo normativo ‘comum e padronizado'”.

A sentença também reforça a importância do protagonismo autista, garantindo que as pessoas com autismo sejam incluídas nas decisões que afetam suas vidas. Ao considerar as particularidades do autismo, o juiz reconheceu a necessidade de medidas que promovam a inclusão social e garantam o desenvolvimento pleno das pessoas autistas.

“A pauta de julgamento pelo Poder Judiciário sob a perspectiva de gêneros ou de minorias não comumente visibilizadas permite notar, observar e garantir à comunidade do autismo o necessário protagonismo autista, diante da importância de incluir o grupo-alvo das intervenções administrativas e judiciais dos autistas, em uma lente que lhes permita a garantia de seus direitos, sua categorização, suas particularidades, prestigiando o princípio da dignidade da pessoa humana (CRFB, art. 1º, III) em uma perspectiva do protagonismo autista”.

A decisão será analisada pelo Tribunal de Justiça, por se tratar de sentença que concedeu o pedido formulado no Mandando de Segurança. Esse tipo de ação, que busca proteger um direito líquido e certo de qualquer pessoa, tem uma lei própria que regulamenta a sua tramitação, a Lei de nº 12.016, de 2009.

A lei do Mandado de Segurança, em seu artigo 14, parágrafo 1º, prevê que a sentença que concede a segurança, ou seja, atende ao pedido, “estará sujeita obrigatoriamente ao duplo grau de jurisdição”, o que é conhecido no direito como “reexame necessário”.

https://www.tjto.jus.br/comunicacao/noticias/justica-estadual-garante-reducao-de-jornada-de-trabalho-sem-corte-salarial-para-pai-de-crianca-com-autismo

TJTO

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