Dispõe sobre os direitos das crianças e adolescentes em ambiente digital.
O CONSELHO NACIONAL DOS DIREITOS DA CRIANÇAS E DO ADOLESCENTES – CONANDA, órgão colegiado de caráter formulador, deliberativo e controlador das ações de promoção e defesa dos direitos da criança e do adolescente, no exercício das atribuições previstas pela Lei nº 8.242, de 12 de outubro de 1991, no Decreto nº 11.473, de 6 de abril de 2023 e na Resolução nº 217, de 26 de dezembro de 2018, a qual aprova o seu Regimento Interno:
Considerando o art. 227 da Constituição Federal, que estabelece a prioridade absoluta na garantia dos direitos de crianças e adolescentes em todas as situações que lhes digam respeito, inclusive no ambiente digital, que se aplica não somente o Estado brasileiro e à sociedade, mas também ao setor privado, inclusive as plataformas digitais;
Considerando a Convenção sobre os Direitos de Crianças da Organização das Nações Unidas (ONU), promulgada pelo Decreto nº 99.710 de 1990;
Considerando o Comentário Geral nº 25 de 2021, do Comitê de Direitos da Crianças da ONU, sobre direitos da criança em relação ao ambiente digital, que vincula a interpretação dos direitos previstos na Convenção sobre os Direitos da Criança no ambiente digital, bem como o Comentário Geral nº 14 sobre o direito da criança de ter seu interesse superior considerado primordialmente;
Considerando o disposto nos arts. 2º, 3º, 4º 5º, 15, 16, 53 e 86 do Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei Federal nº 8.069, de 13 de julho de 1990;
Considerando o disposto nos arts. 2º, parágrafo único, 3º, VIII, e 4º da Lei 13.185, de 6 de novembro de 2015, que institui o Programa de Combate à Intimidação Sistemática (Bullying);
Considerando o disposto na Lei 14.811, de 12 de janeiro de 2024, que institui medidas de proteção à criança e ao adolescente contra a violência nos estabelecimentos educacionais ou similares e prevê a Política Nacional de Prevenção e Combate ao Abuso e Exploração Sexual da Criança e do Adolescente;
Considerando o disposto no art. 14 da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais, Lei nº 13.709, de 14 de agosto de 2018;
Considerando o Marco Legal da Primeira Infância (Lei nº 13.257/2016), em especial o seu art. 5º, que garante a proteção da criança contra toda forma de pressão consumista;
Considerando o Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90), em especial os seus arts. 1º, 4º, 6º, 8º, 36, 37, 39 e 51;
Considerando o Decreto nº 9.579 de 22 de novembro de 2018, que prevê o direito à publicidade adequada;
Considerando a Resolução nº 163 de 2014 do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA), que dispõe sobre a abusividade do direcionamento de publicidade e de comunicação mercadológica à criança e ao adolescente;
Considerando a Resolução nº 113, alterada pela Resolução nº 117, ambas de 2006 do Conselho Nacional de Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA), que dispõe sobre a institucionalização e o fortalecimento do Sistema de Garantias dos Direitos da Criança e do Adolescente; e
Considerando que as tecnologias digitais são vitais no mundo atual e proporcionam oportunidades para a efetivação dos direitos das crianças e adolescentes, mas também impõem riscos de violações, exploração e abuso resolve:
Art. 1º Esta Resolução dispõe sobre os direitos de crianças e adolescentes no ambiente digital.
Parágrafo único. Para os fins desta Resolução, considera-se ambiente digital as tecnologias da informação e comunicação (TICs), como redes, conteúdos, serviços e aplicativos digitais disponíveis no ambiente virtual (Internet); dispositivos e ambientes conectados; realidade virtual e aumentada; inteligência artificial (IA); robótica; sistemas automatizados, biometria, sistemas algorítmicos e análise de dados, em consonância com o Comentário Geral nº 25 de 2021, do Comitê de Direitos da Crianças da ONU.
CAPÍTULO I
DOS PRINCÍPIOS BÁSICOS DE PROTEÇÃO DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE NO AMBIENTE DIGITAL
Art. 2º A garantia e efetivação dos direitos de crianças e adolescentes em ambiente digital é de responsabilidade compartilhada do poder público, famílias, sociedade, incluindo empresas provedoras de produtos e serviços digitais.
Art. 3º A garantia e efetivação dos direitos da criança e do adolescente em ambiente digital é pautada pelos seguintes princípios:
I – Não discriminação;
II – Prevalência, primazia e precedência do superior interesse e dos direitos da criança e do adolescente;
III – Direito à vida, à sobrevivência e ao desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social;
IV – Respeito à liberdade de expressão e de consciência, ao acesso à informação, à autonomia progressiva e à escuta e participação da criança e do adolescente;
V – O livre desenvolvimento da personalidade, da dignidade, da honra e da imagem; VI – A promoção de um ambiente digital saudável e seguro, livre de assédio, discriminação e discursos de ódio;
VII – O estímulo ao uso consciente e responsável para o exercício da cidadania em ambientes digitais; e
VIII – a proteção de dados, a autodeterminação informativa e a privacidade.
IX – a proteção contra toda forma de negligência, discriminação, violência, crueldade, opressão e exploração, inclusive contra a exploração comercial.
X – a garantia dos direitos das crianças e adolescentes por design dos produtos e serviços em ambientes digitais.
Art. 4º Todas as crianças e adolescentes devem ter garantido o direito ao acesso ao ambiente digital, assegurando-se que os conteúdos e serviços acessados sejam compatíveis com seus direitos e seu superior interesse.
Parágrafo único. As autoridades e empresas provedoras de serviços digitais devem adotar medidas para combater a exclusão digital, capacitismo, discriminação ilegal ou abusiva, direta ou indireta, baseada em gênero, deficiência, crença e culto religioso, situação socioeconômica, sexualidade, origem étnica e racial, dentre outros, garantindo a inclusão e acessibilidade digital e a conectividade significativa de todas as crianças e adolescentes.
Art. 5º O interesse superior deve ser aferido em conformidade com a Doutrina da Proteção Integral dos Direitos da Criança e do Adolescente, observando os direitos previstos na legislação nacional e normas internacionais, sendo esse o princípio orientador e primário para a garantia dos direitos e do bem-estar da criança e do adolescente no ambiente digital.
Parágrafo único. As autoridades públicas, entes privados e a sociedade devem zelar para que todas as ações realizadas, a concepção, o desenvolvimento e as ações de comunicação de qualquer produto ou serviço nos meios digitais levem em conta os direitos e o interesse superior da criança e do adolescente, sobretudo liberdade de expressão e aos direitos de buscar, receber e difundir informação segura, confiável e íntegra.
Art. 6º As crianças e adolescentes tem o direito à proteção com absoluta prioridade por parte das famílias, Estado, sociedade, inclusive empresas, contra todas as violações de direitos relacionados aos riscos de conteúdo, contrato, contatos e condutas de terceiros que possam colocar em risco sua vida, dignidade e seu desenvolvimento integral, devendo estarem a salvo de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
§ 1º As violações de direitos relacionadas aos riscos de conteúdo, contrato, contato e conduta incluem, dentre outros, conteúdos violentos e sexuais, cyber agressão ou cyberbullying, discurso de ódio, assédio, adicção, jogos de azar, exploração e abuso – inclusive sexual e comercial, incitação ao suicídio, à automutilação, publicidade ilegal ou a atividades que estimulem e/ou exponham a risco sua vida ou integridade física.
§ 2º O uso de equipamentos e plataformas digitais não deve ser prejudicial, tampouco substituir ou restringir as interações pessoais entre crianças e adolescentes, familiares, cuidadores e a comunidade em geral.
§ 3º Na primeira infância, em ambiente social, especialmente no relacionamento com familiares e cuidadores, deve ser conferida especial atenção aos efeitos da tecnologia e dos ambientes digitais no desenvolvimento cognitivo, emocional e social do indivíduo.
§ 4º As autoridades públicas, provedores de produtos e serviços digitais devem difundir informações sobre o uso saudável, seguro e apropriado da tecnologia por crianças e adolescentes, levando em conta o resultado de pesquisas sobre os respectivos efeitos em seu desenvolvimento social e neurológico, especialmente na primeira infância.
Art. 7º As crianças e adolescentes devem participar ativamente do desenvolvimento de políticas, programas, serviços e atividades formativas sobre os ambientes digitais, levando-se em conta suas necessidades e grau de autonomia e desenvolvimento progressivo de suas capacidades.
Art. 8º A promoção e proteção dos direitos de crianças e adolescentes em ambiente digital deve ser realizada à luz da legislação existente, especialmente da Constituição Federal, da Convenção dos Direitos da Criança, do Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei Federal nº 8.069, de 13 de julho de 1990.
CAPÍTULO II
DA POLÍTICA NACIONAL DE PROTEÇÃO DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE NO AMBIENTE DIGITAL
Art. 9º A política nacional de proteção dos direitos da criança e do adolescente no ambiente digital será desenvolvida e coordenada pela Secretaria Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania e pelo Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente – CONANDA, observadas as competências legais de cada ente.
§ 1º A política nacional compreenderá ações conjuntas, integradas e multissetoriais para enfrentamento e erradicação de todos os tipos de violência, abuso e exploração no ambiente digital de crianças e adolescentes, promoção do uso equilibrado e positivo de equipamentos digitais, manutenção e fortalecimento de vínculos familiares e comunitários, inclusão digital, cultura de proteção de dados, educação midiática e difusão de informação sobre direitos e o uso seguro da internet para crianças e adolescentes, familiares, cuidadores e integrantes do sistema de garantia de direitos da criança e do adolescente.
§ 2º A política nacional de proteção dos direitos da criança e do adolescente no ambiente digital será desenvolvida em até 90 (noventa) dias da publicação desta Resolução. CAPÍTULO III Da liberdade de expressão no ambiente digital
Art. 10. As crianças e adolescentes devem ter acesso à informação no ambiente digital, cujo direito só poderá ser restringido nas hipóteses previstas em Lei e para o alcance dos objetivos previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990.
Art. 11. O direito à liberdade de expressão de crianças e adolescentes no ambiente digital inclui a liberdade de buscar, receber e compartilhar informações seguras, íntegras e adequadas, utilizando-se de qualquer ferramenta ou serviço conectado à internet.
§ 1º Qualquer restrição ao direito de liberdade de expressão no ambiente digital deve ser legal, necessária e proporcional, tendo como base o superior interesse da criança e do adolescente.
§ 2º O uso de ferramentas de moderação e controle de conteúdo digital que visam impedir que crianças e adolescentes tenham acesso a conteúdo e serviços nocivos deve ser compatível com o respeito ao seu direito à liberdade de expressão e de acesso à informação.
CAPÍTULO IV
DO DIREITO À PRIVACIDADE E PROTEÇÃO DE DADOS NO AMBIENTE DIGITAL
Art. 12. A privacidade de crianças e adolescentes deve ser respeitada e protegida, por padrão, em todos os ambientes e serviços digitais, inclusive quanto ao tratamento e armazenamento de seus dados pessoais.
§ 1º Será recolhida apenas a quantidade mínima de dados pessoais para os fins de uso do serviço, cujo armazenamento deverá durar apenas o tempo necessário para a finalidade da coleta.
§ 2º O tratamento de dados de que trata este dispositivo deverá observar os mais altos padrões de proteção, segurança e procedimentos éticos, que devem estar alinhados à proteção integral e prioritária garantida constitucionalmente a crianças e adolescentes, garantindo a equiparação de dados de crianças e adolescentes a dados pessoais sensíveis.
Art. 13. As empresas provedoras e prestadoras de serviços digitais aos quais crianças e adolescentes tenham acesso devem informá-los sobre o uso de seus dados, em linguagem simples, acessível, adequada e transparente.
Art. 14. Sempre que o tratamento de dados pessoais de crianças e adolescentes for realizado com base no consentimento deverá ser obtido de forma livre e prévia junto aos responsáveis, solicitado de forma específica e destacada, para finalidades específicas e, sempre que possível, junto à criança ou adolescente, observado seu grau de maturidade e compreensão sobre os efeitos do consentimento.
Parágrafo único. O consentimento fornecido pela criança ou adolescente poderá ser retirado a qualquer momento, devendo a decisão ser respeitada pelos pais, cuidadores e demais responsáveis.
Art. 15. Os dados pessoais de crianças e adolescentes não devem ser utilizados para fins comerciais, como criação e definição de perfis de comportamento, consumo e segmentação mercadológica, tampouco para direcionamento de publicidade ou ampliação de seu alcance, conforme disposto na Resolução CONANDA nº 163 de 13 de março de 2014.
Art. 16. Qualquer tipo de mecanismo de vigilância e monitoramento digital de crianças e adolescentes, associado a ferramentas de automação e tratamento de dados pessoais, deve respeitar seu direito à privacidade e não deve ser utilizado de forma indiscriminada e injustificável.
Parágrafo único. Quando forem utilizados mecanismos de segurança, justificada a garantia de direitos e o interesse superior de crianças e adolescentes, devem ser priorizadas as medidas menos invasivas, sendo imprescindível que a criança ou adolescente tenha conhecimento sobre seu funcionamento e que lhe seja dado o direito de manifestar oposição, observado seu grau de maturidade e compreensão.
CAPÍTULO V
DO DEVER DE CUIDADO E DAS RESPONSABILIDADES DAS EMPRESAS PROVEDORAS DE PRODUTOS E SERVIÇOS DIGITAIS
Art. 17. As empresas provedoras de produtos e serviços digitais utilizados por crianças e adolescentes, em funcionamento no Brasil, inclusive aquelas sediadas no exterior, são responsáveis pela implementação e garantia dos direitos deste público, nos ambientes digitais por elas produzidos e regulados.
§ 1º A responsabilização das empresas pela violação dos direitos de crianças e adolescentes em ambiente digital está pautada na legislação vigente relacionada às obrigações empresariais e à garantia dos direitos desses indivíduos.
§ 2º As empresas provedoras devem envidar esforços para atender às necessidades de crianças e adolescentes desde a concepção, o desenvolvimento e ações de comunicação de seus ambientes e sistemas, de acordo com os direitos e o interesse superior desse público.
§ 3º As empresas provedoras devem criar e aprimorar mecanismos que previnam o uso de serviços e ambientes digitais por crianças e adolescentes sempre que seus serviços não sejam adequados e, seguros a esse público.
§ 4º A previsão do caput não pode ser utilizada para criar obstáculos ao direito de acesso à informação e de participação de crianças e adolescentes no ambiente digital.
§ 5º Os códigos de conduta das empresas de tecnologia devem incluir orientações de como reportar riscos e sugerir melhorias para a proteção dos direitos das crianças e adolescentes.
Art. 18. As empresas devem assegurar a absoluta prioridade à proteção e efetivação dos direitos de crianças e adolescentes acima de qualquer consideração técnica ou econômica, prevenindo, mitigando, coibindo e adotando medidas de responsabilização diante qualquer forma de abuso, violência, discriminação, capacitismo e difusão de discurso de ódio e desinformação.
Parágrafo único. Para a efetiva promoção e proteção dos direitos das crianças e adolescentes, as empresas deverão priorizar ações rápidas, em prazo hábil e suficiente, com vistas a prevenir riscos e práticas ilícitas, inclusive as geradas por terceiros, no âmbito de seus serviços.
Art. 19. Mecanismos efetivos de verificação etária nos serviços e ambientes digitais acessíveis a crianças e adolescentes devem ser disponibilizados para impedir que crianças e adolescentes tenham acesso a plataformas, produtos, serviços e conteúdos ilícitos ou incompatíveis com sua idade.
Parágrafo único. Os dados de crianças e adolescentes obtidos pelos mecanismos e sistemas de verificação etária não poderão ser utilizados para quaisquer outros fins, a não ser a verificação etária.
Art. 20. As empresas provedoras de ambientes e serviços digitais devem disponibilizar mecanismos de mediação parental e recomendar ativamente a participação de responsáveis legais, como forma de promoção do uso seguro e saudável de seus serviços no ambiente digital.
Art. 21. As empresas provedoras devem disponibilizar e divulgar amplamente canais de fácil acesso e em linguagem simples, acessível e de fácil compreensão para crianças, para escuta, diálogo e recebimento de denúncias de conteúdos nocivos ou ilegais, sem prejuízo dos direitos de revisão das decisões e acesso à informação sobre os procedimentos de moderação.
§ 1º Os canais de escuta, diálogo e denúncia devem disponibilizar, no mínimo, informação em prazo hábil e suficiente sobre o andamento e resultado das denúncias realizadas.
§ 2º Para fins de transparência, as empresas devem publicizar, regularmente, informações sobre:
I – Quantidade de denúncias recebidas e categorias de ofensas e violações;
II – Métodos de moderação e governança aplicados no processo de análise de denúncias e na eventual aplicação de sanções.
§ 3º Os mecanismos de mediação parental, denúncia de violações e outras formas de justiça, proteção e segurança no ambiente digital devem ser continuamente aprimorados com base em evidências e disponibilizados de forma ampla, acessível, gratuita e proativa para crianças e adolescentes, famílias, comunidade escolar, poder público e demais responsáveis.
Art. 22. As empresas provedoras são responsáveis por identificar, medir, avaliar e mitigar preventiva e diligentemente os riscos reais ou previsíveis aos direitos e interesse superior de crianças e adolescentes relacionados às funcionalidades, à concepção, gestão e funcionamento de seus serviços e sistemas, inclusive os algorítmicos, de redes sociais, jogos, aplicativos e demais ambientes digitais, especialmente aqueles relacionados à:
I – saúde mental, como a adicção, o tempo excessivo de tela e possíveis prejuízos à autoestima e ao bem-estar físico e emocional de crianças e adolescentes;
II – violação do direito à convivência familiar e comunitária;
III – difusão de conteúdos nocivos, danosos e ilegais nos serviços e ambientes digitais;
IV – discriminação direta ou indireta em decorrência de sistemas algorítmicos ou do uso de dados pessoais sensíveis, em razão de características pessoais, especialmente raça, cor, etnia, identidade de gênero, orientação sexual, deficiência, idade, origem, convicções filosóficas, políticas ou religiosas ou por qualquer particularidade ou condição;
V – inobservância dos direitos fundamentais previstos na Constituição da República, na legislação nacional e nos tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário;
VI – exposição da imagem de crianças e adolescentes de forma excessiva ou em contexto vexatório;
VII – propagação de conteúdos que incorram em abuso e exploração sexual de crianças e adolescentes;
VIII – propagação de conteúdos que induzam, instiguem ou auxiliem a automutilação ou suicídio, em observância ao art. 122 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940; e
IX – discurso de ódio, incitação à prática de crimes contra crianças e adolescentes ou apologia a fato criminoso ou a autor de crimes contra crianças e adolescentes.
Parágrafo único. A gradação e avaliação de riscos deve considerar os sistemas de moderação de conteúdo, os termos e políticas de uso, os sistemas e mecanismos de publicidade e propaganda, e os possíveis usos nocivos e maliciosos nos ambientes e serviços digitais.
Art. 23. As empresas de tecnologia devem desenvolver mecanismos de proteção e prevenção de violações específicas para o nível dos intermediários que agregam grandes bases de seguidores de crianças e adolescentes, como influenciadores, streamers, gamers, administradores de grupos e canais, moderadores de lives e afins.
Parágrafo único. As empresas devem tomar medidas de prevenção à radicalização de crianças e adolescentes nos ambientes digitais por elas regulados, bem como ao seu recrutamento para o crime, o extremismo e o comportamento e discurso violentos contra outros ou contra si mesmos, promovendo uma cultura de paz, convivência democrática e respeito à diferença.
Art. 24. As empresas devem priorizar, nos seus sistemas, ferramentas, equipes e recursos de moderação, o controle de conteúdo ilegal ou impróprio envolvendo ou direcionado para crianças e adolescentes.
§ 1º As empresas devem prever, em seus termos de uso, proibição de postagem de conteúdo ilegal ou impróprio envolvendo ou direcionado para crianças e adolescentes, bem como sanções proporcionais aos usuários infratores.
§ 2º As empresas devem disponibilizar, para os usuários, mecanismos de notificação eletrônica de conteúdo ilegal ou impróprio envolvendo ou direcionado para crianças e adolescentes.
§ 3º As empresas devem tornar indisponíveis conteúdo ilegal ou nocivo envolvendo ou direcionado para crianças e adolescentes tão logo constatado o seu teor, independentemente de ordem judicial.
Art. 25. Os usuários terão direito ao devido processo de moderação, com a notificação e direito de esclarecimento e de revisão em tempo hábil, sem prejuízo da indisponibilização ou remoção rápida dos conteúdos considerados ilegais, impróprios ou nocivos para crianças e adolescentes.
Art. 26. Resguardado o respeito à proteção de dados pessoais e demais normas pertinentes em vigor, as empresas provedoras de produtos e serviços digitais devem atuar para facilitar o compartilhamento de dados e evidências com a comunidade de pesquisa acadêmica e da sociedade civil dedicada à compreensão dos riscos e impactos do ambiente digital sobre crianças e adolescentes.
Parágrafo único. As empresas devem disponibilizar, em português, em linguagem simples, acessível e de fácil compreensão para crianças e adolescentes relatórios, dados e evidências atualizados sobre a efetividade das medidas tomadas para a garantia de direitos de crianças e adolescentes nos ambientes digitais por elas regulados.
Art. 27. As empresas devem garantir em suas plataformas, serviços e sistemas a acessibilidade a todas as crianças e adolescentes, assegurando o desenho universal nos termos da Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência).
Art. 28. Para fins de conformidade com o ordenamento jurídico nacional, as empresas deverão publicar, ao menos anualmente, relatórios de:
I – Transparência, quanto ao funcionamento de seus serviços e sistemas, inclusive os algorítmicos, bem como do uso dos dados colhidos durante o funcionamento de seus serviços e, no mínimo: a. medidas de governança adotadas na concepção, desenvolvimento e emprego de seus sistemas; b. detalhamento dos métodos empregados para prevenção e mitigação de riscos; c. detalhamento das sanções aplicáveis a infratores; e d. exposição de esforços envidados para educação e promoção de direitos e uso consciente, saudável e responsável dos ambientes e serviços digitais.
II – Avaliação de riscos aos direitos e o interesse superior de crianças e adolescentes, de maneira atualizada, considerando as especificidades do contexto brasileiro e priorizando a avaliação anterior à introdução de novos serviços e funcionalidades; e
III – Auditoria independente, que avalie a conformidade com o ordenamento jurídico e o cumprimento das responsabilidades e do Dever de Cuidado estabelecidos pela normatização legal e infralegal vigentes no território nacional.
CAPÍTULO VI
DAS AÇÕES DE MOBILIZAÇÃO E CONSCIENTIZAÇÃO SOBRE O IMPACTO DO AMBIENTE DIGITAL PARA CRIANÇAS E ADOLESCENTES
Art. 29. O Poder Público e as empresas provedoras de produtos e serviços digitais devem promover ações de sensibilização sobre os direitos e riscos a crianças e adolescentes no ambiente digital, focando, particularmente, nos setores cujas práticas tenham impacto direto ou indireto nas crianças e adolescentes.
§ 1º Deve ser estimulado o desenvolvimento de ações educacionais para crianças e adolescentes, familiares, responsáveis e cuidadores, autoridades públicas e sociedade em geral, para ampliar o conhecimento sobre os direitos de crianças e adolescentes, especificamente quanto aos benefícios e riscos associados com produtos e serviços digitais, bem como ampliar a autonomia e o senso crítico, individual e coletivos, sobre decisões relacionadas ao desenvolvimento e gestão do ambiente digital.
§ 2º As ações mencionadas no § 1º devem incluir informações sobre como as crianças e adolescentes podem se beneficiar de produtos e serviços digitais para desenvolver seu conhecimento, profissionalização e habilidades digitais; como proteger a privacidade; como prevenir a vitimização e a radicalização; como reconhecer que uma criança ou adolescente é ou foi vítima de violência no ambiente digital; e como prestar atendimento adequado às vítimas.
§ 3º Profissionais que trabalham direta ou indiretamente para ou com crianças, incluindo na indústria de tecnologia, devem receber treinamento sobre o impacto do ambiente digital nos direitos da criança e do adolescente, o exercício e a proteção dos direitos desse público, e a identificação de riscos de violação e vitimização de crianças e adolescentes no ambiente digital.
Disposições finais:
Art. 30. O tratamento de denúncias de violação dos direitos de crianças e adolescentes no ambiente digital recebidas pelas empresas provedoras deve compor fluxo de encaminhamento à Ouvidoria Nacional dos Direitos Humanos (Disque 100), aos órgãos do Sistema de Garantia de Direitos, em especial aos Conselhos Tutelares, ao Ministério Público, Defensoria Pública, órgãos de defesa do consumidor, e às autoridades policiais, preferencialmente delegacias especializadas em crimes virtuais e na proteção dos direitos de crianças e adolescentes.
Parágrafo único. O retardamento ou omissão, culposos ou dolosos, no encaminhamento das denúncias à Ouvidoria Nacional dos Direitos Humanos poderá culminar nas sanções previstas no Art. 70-B, parágrafo único, da Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990.
Art. 31. Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação.
MARINA DE POL PONIWAS
Presidente do Conselho