A Justiça do Trabalho condenou uma indústria alimentícia, com sede em Sete Lagoas, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, ao pagamento de indenização por danos morais, no valor de R$ 6 mil, a um ex-empregado com deficiência visual que não tinha condições adequadas de trabalho. Ele foi contratado em vaga reservada a pessoas com deficiência, mas ficou provado no processo que o setor de trabalho não era adaptado com rampa de acesso e sinalização tátil para o suporte de pessoas cegas ou com baixa visão, como o autor da ação.
A decisão é dos desembargadores da Segunda Turma do TRT-MG, que mantiveram, sem divergência, a sentença proferida pelo juízo da 1ª Vara do Trabalho de Sete Lagoas. Além de mostrar que o amparo à pessoa com deficiência deve estar presente também nas relações de trabalho, a decisão reforça a importância do desenvolvimento de meios de inclusão na sociedade dessa parcela da população, preceito defendido pelo “Setembro Verde”, campanha que marca o Dia Nacional de Luta da Pessoa com Deficiência, celebrado hoje, 21 de setembro, data que foi oficializada em 14 de julho de 2005, pela Lei nº 11.133.
Defesa
A empresa interpôs recurso, alegando não ter responsabilidade pelo surgimento ou agravamento da doença noticiada no processo. Afirmou que sempre cumpriu com as obrigações em todas as atividades, principalmente no trato com os empregados. Sustentou ainda que “eventuais intempéries na dinâmica laborativa não podem constituir ofensa de índole moral”.
Mas, para a desembargadora relatora, Maristela Íris da Silva Malheiros, ficou configurado o dano de ordem extrapatrimonial sofrido pelo ex-empregado, pessoa com deficiência, em razão das condições inadequadas de trabalho que eram proporcionadas.
A julgadora ressaltou que o profissional foi contratado em vaga reservada a pessoas com deficiência. E, conforme laudo médico, ele “tem uma patologia genética e hereditária (retinose pigmentar), não agravada pelo trabalho desenvolvido em favor da empresa”.
No entendimento da magistrada, o conjunto probatório revelou que a empregadora não observou devidamente o dever de garantir condições adequadas de trabalho referentes à saúde e à higiene do trabalhador com deficiência, “incorrendo, pois, em culpa”.
Depoimento
Testemunha contou que já presenciou colegas de trabalho fazerem brincadeiras com o trabalhador em relação à deficiência visual, chamando-o de “ceguinho” e “quatro olho”. Segundo a testemunha, o líder do setor não estava presente quando eram feitas essas brincadeiras.
Além disso, a testemunha também afirmou que o local de trabalho não era adequado para pessoas com deficiência visual. Pelo depoimento, “não havia rampas de acesso e nem a sinalização dos pisos era adequada em setores como o de desossa, onde o autor já trabalhou”. Outra testemunha declarou que sabia que o trabalhador trombava em objetos e confirmou que não há rampas de acesso no setor.
Para a relatora, é inegável que, ao não fornecer condições adequadas de trabalho, notadamente quanto à acessibilidade com rampa e à sinalização do piso, a empresa praticou conduta contrária ao direito, ofendendo a honra e a dignidade do trabalhador. “Por isso, deve ser mantida a condenação à reparação dos danos morais. Esclareça-se, na oportunidade, que o dano moral se verifica ‘in re ipsa’, sendo desnecessária a demonstração do efetivo abalo psicológico sofrido em razão da conduta ilícita praticada”, pontuou.
Ela mencionou no acórdão que a proteção da pessoa com deficiência foi preocupação do legislador constituinte. “É o que mostram os artigos 23, II, e 24, XIV; e, em especial, os artigos 7º, XXXI; 37, VIII; e 203, IV; todos da Constituição da República, cuja aplicabilidade afeta diretamente a relação de emprego”, ressaltou.
Ademais, ela destacou que, em 2015, foi instituída a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146). “Pelo artigo 37, constitui modo de inclusão da pessoa com deficiência no trabalho a colocação competitiva, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas, nos termos da legislação trabalhista e previdenciária, na qual devem ser atendidas as regras de acessibilidade, o fornecimento de recursos de tecnologia assistiva e a adaptação razoável no ambiente de trabalho”.
Decisão
A magistrada manteve a condenação de R$ 6 mil imposta pelo juízo de origem, reforçando que o valor está em consonância com os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Na decisão, ela levou em consideração a gravidade do fato, o grau de culpa do agente, os prejuízos ocasionados, as condições pessoais da vítima e a capacidade de quem vai suportar a indenização, de modo a não propiciar o enriquecimento sem causa do lesionado, buscando também o efeito inibitório da repetição do risco e do dano.
Segundo a julgadora, o valor arbitrado visa a minorar e compensar o sofrimento experimentado pela vítima, pautando-se num propósito pedagógico, de modo que a indenização seja proporcional à lesão sofrida. “Deve-se destacar que a indenização por dano moral não é o preço da dor, que nenhum dinheiro paga. De fato, o dinheiro serve, tão somente, para mitigar, para consolar e para estabelecer certa compensação causada pelo ofensor ao ofendido”. Atualmente, o processo aguarda decisão de admissibilidade do recurso de revista.
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