A 1ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 17 Região (ES) reconheceu a responsabilidade objetiva da empresa e a condenou a pagar indenização de R$ 250 mil a um operador de equipamentos. De acordo com o relator do acórdão, desembargador Cláudio Armando Couce de Menezes, ficou comprovado nos autos que o trabalhador sofreu danos psíquicos decorrentes do rompimento da barragem da Mina Córrego do Feijão, em janeiro de 2019.
O trágico acidente tirou a vida de 270 pessoas, entre funcionários da Vale, terceirizados e moradores locais.
Transtorno depressivo pós-traumático
A ação foi ajuizada em dezembro de 2021. De acordo com os autos, o trabalhador havia sido admitido pela empresa em 2005 e foi transferido de Brumadinho/MG para Vitória/ES em 2018, exercendo o cargo de operador de equipamentos móveis e instalações. No desabamento da barragem em Brumadinho/MG, em janeiro de 2019, ele perdeu a irmã caçula, que também era funcionária da empresa, um sobrinho e vários antigos colegas de trabalho, o que desencadeou graves problemas psicológicos. Diagnosticado com transtorno depressivo pós-traumático, iniciou tratamento psiquiátrico.
Sete meses após a tragédia, o operador foi enviado de volta a Brumadinho, pela empresa. Perícia médica o considerou apto ao trabalho. Durante a pandemia, passou a atuar em home office e continuou com o tratamento médico.
Demissão
O trabalhador chegou a ser declarado incapacitado para o trabalho em três ocasiões, ficando afastado do labor por vários meses. Em novembro de 2021, foi demitido sem justa causa, com aviso prévio na modalidade indenizada.
O laudo médico emitido na ocasião constatou que “o autor não possuía condições para nenhuma atividade laborativa devido às oscilações de humor e ao grau acentuado e refratário ao tratamento de sua patologia” e indicou afastamento por 90 dias. A empresa, no entanto, não reviu a decisão de demitir o operador, alegando que ele apresentava condições de trabalhar.
Reintegração
O trabalhador então recorreu à Justiça do Trabalho pedindo a nulidade de sua demissão e o retorno à empresa, em função compatível com a sua limitação. Em fevereiro de 2022, o juiz titular da 3ª Vara do Trabalho de Vitória, Welington do Nascimento Andrade, concedeu liminar tornando sem efeito a demissão e determinando a reintegração imediata ao emprego, com restabelecimento do plano de saúde.
“Não há como justificar que a empresa vire as costas para o trabalhador, no momento em que ele mais precisa dela”, afirmou o juiz.
Sentença
O juiz da 3ª VT considerou em sua decisão laudo pericial confirmando que o autor estava com a saúde abalada na época da demissão. “Dessa forma, não há dúvida de que a despedida desse trabalhador não poderia ter ocorrido, pelo menos naquele momento”, afirma o magistrado. O operador deveria ter sido encaminhado ao INSS para que lhe fosse concedido o benefício previsto em lei.
A sentença, proferida em março deste ano, confirmou a reintegração do trabalhador ao emprego, com a compensação dos valores pagos pela empresa na rescisão contratual, incluindo a indenização de 40% sobre o FGTS. Tanto o trabalhador quanto a empresa recorreram da decisão.
Acórdão
No entendimento do relator do acórdão, desembargador Cláudio Couce de Menezes, “ainda que o autor não estivesse trabalhando no exato momento do acidente e não tenha sofrido lesão à sua integridade física, não há a menor dúvida acerca do sofrimento e angústia por ele experimentados, pois seria uma vítima em potencial se estivesse presente quando ocorreu a tragédia. Além disso, teve que lidar com a perda de sua irmã que, após o fim da licença maternidade, havia retornado ao trabalho no dia do fatídico acidente”.
O magistrado destaca, ainda, não haver nos autos provas de diagnóstico de males psíquicos ou psicológicos antes do rompimento da barragem. Assim, conclui o relator: “não é possível dissociar as doenças psíquicas que atualmente afligem o reclamante daquelas doenças resultantes do evento traumático vivenciado em Brumadinho”.
Para o desembargador, ficou comprovado o nexo de causalidade entre a doença do trabalhador e a tragédia. A própria empresa emitiu CAT comunicando o diagnóstico, na qual consta “transtorno de adaptação”, com CID referente a “episódio depressivo moderado”.
Responsabilidade civil subjetiva e objetiva
A configuração da culpa da empresa resta configurada, de acordo com o relator, pois “a empregadora descumpriu com o seu dever geral de diligência, ao colocar em risco a integridade física e psicológica do autor diante do evento traumático por ele vivenciado no trabalho”.
Menezes também aponta a responsabilidade objetiva de quem desenvolve atividade de risco: “a empregadora é objetivamente responsável pela reparação do dano causado ao trabalhador, que não pode assumir a responsabilidade pelos riscos inerentes à atividade do réu. Isso seria, de fato, um absurdo.”
No caso presente, explica o magistrado, houve afastamento por prazo superior a 15 dias. O autor gozou de benefício previdenciário e encontrava-se doente no momento da dispensa. Assim sendo, tem direito à estabilidade garantida pelo artigo 118, da Lei 8.213/91.
Dano moral
O relator negou o recurso da empresa e deu provimento ao recurso do trabalhador, fixando indenização de R$ 254 mil.
O voto do desembargador Cláudio Armando Couce de Menezes foi acompanhado pelos demais integrantes da 1ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 17ª Região, na sessão ordinária presencial do dia 27 de julho. Participaram a desembargadora Wanda Lúcia Costa Leite França Decuzzi (presidente da turma) e Valdir Donizetti Caixeta. Ainda cabe recurso.
Processo 0001082-29.2021.5.17.0003
TRT17