Institui o Pacto Nacional de Prevenção aos Feminicídios.
O Presidente da República, no uso das atribuições que lhe confere o art. 84, caput, incisos IV e VI, alínea “a”, da Constituição, e tendo em vista o disposto na Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher, promulgada pelo Decreto nº 4.377, de 13 de setembro de 2002, e na Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, promulgada pelo Decreto nº 1.973, de 1º de agosto de 1996,
DECRETA:
CAPÍTULO I
DO PACTO NACIONAL DE PREVENÇÃO AOS FEMINICÍDIOS
Art. 1º Fica instituído o Pacto Nacional de Prevenção aos Feminicídios, com o objetivo de prevenir todas as formas de discriminação, misoginia e violência de gênero contra as mulheres por meio da implementação de ações governamentais intersetoriais, da perspectiva de gênero e de suas interseccionalidades.
Parágrafo único. As ações governamentais do Pacto Nacional de Prevenção aos Feminicídios serão implementadas com vistas a prevenir as mortes violentas de mulheres em razão da desigualdade de gênero e garantir os direitos e o acesso à justiça às mulheres em situação de violência e aos seus familiares.
Art. 2º O Pacto Nacional de Prevenção aos Feminicídios é um instrumento de articulação e operacionalização dos objetivos, das diretrizes e dos princípios descritos na Política Nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres.
Art. 3º São objetivos específicos do Pacto Nacional de Prevenção aos Feminicídios:
I – fomentar o desenvolvimento de ações governamentais de prevenção primária, secundária e terciária a todas as formas de discriminação, misoginia e violência de gênero contra as mulheres, em sua diversidade, de forma articulada, intersetorial, multidisciplinar, interministerial e interfederativa, envolvidos os órgãos da administração pública federal, os governos estaduais, municipais e distrital; e
II – envolver a sociedade civil nos processos de participação e controle social das ações de prevenção primária, secundária e terciária a todas as formas de discriminação, misoginia e violência de gênero contra as mulheres, em sua diversidade.
CAPÍTULO II
DOS EIXOS ESTRUTURANTES
Art. 4º São eixos estruturantes do Pacto Nacional de Prevenção aos Feminicídios:
I – prevenção primária – ações planejadas para evitar que a violência aconteça e que visem a mudança de atitudes, crenças e comportamentos para eliminar os estereótipos de gênero, promover a cultura de respeito e não tolerância à discriminação, à misoginia e à violência com base no gênero e em suas interseccionalidades, e para construir relações de igualdade de gênero, envolvidas as ações de educação, formal e informal, com a participação de setores da educação, da cultura, do esporte, da comunicação, da saúde, da justiça, da segurança pública, da assistência social, do trabalho e do emprego, dentre outros;
II – prevenção secundária – ações planejadas para a intervenção precoce e qualificada que visem a evitar a repetição e o agravamento da discriminação, da misoginia e da violência com base no gênero e em suas interseccionalidades, desenvolvidas por meio das redes de serviços especializados e não especializados nos setores da segurança pública, saúde, assistência social e justiça, dentre outros, e apoiadas com o uso de novas ferramentas para identificação, avaliação e gestão das situações de risco, da proteção das mulheres e da responsabilização das pessoas autoras da violência; e
III – prevenção terciária – ações planejadas para mitigar os efeitos da discriminação, da misoginia e da violência com base no gênero e em suas interseccionalidades e para promover a garantia de direitos e o acesso à justiça por meio de medidas de reparação, compreendidos programas e políticas que abordem a integralidade dos direitos humanos e garantam o acesso à saúde, à educação, à segurança, à justiça, ao trabalho, à habitação, dentre outros.
Parágrafo único. As medidas de reparação de que trata o inciso III do caput incluem o direito à memória, à verdade e à justa responsabilização de pessoas agressoras e reparações financeiras às vítimas sobreviventes e às vítimas indiretas.
CAPÍTULO III
DO COMITÊ GESTOR
Art. 5º Fica instituído o Comitê Gestor do Pacto Nacional de Prevenção aos Feminicídios, no âmbito do Ministério das Mulheres.
Parágrafo único. O Comitê Gestor, órgão colegiado de caráter deliberativo, tem por objetivo articular, formular, implementar, monitorar e avaliar as ações governamentais que integram o Pacto Nacional de Prevenção aos Feminicídios.
Art. 6º Compete ao Comitê Gestor:
I – elaborar e aprovar o plano de ações do Pacto Nacional de Prevenção aos Feminicídios;
II – estabelecer as metas, os indicadores e as estratégias de acompanhamento da execução do plano de ações do Pacto Nacional de Prevenção aos Feminicídios;
III – articular e monitorar os planos de ação estaduais, distrital e municipais dos entes federativos que aderirem ao Pacto Nacional de Prevenção aos Feminicídios;
IV – avaliar e propor a complementação, a alteração ou a exclusão de ações do Pacto Nacional de Prevenção aos Feminicídios;
V – buscar estratégias comuns de implementação das políticas públicas de prevenção aos feminicídios, em regime de colaboração com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios;
VI – gerenciar riscos em conjunto com os entes participantes e em todas as etapas do Pacto Nacional de Prevenção aos Feminicídios;
VII – aprovar, anualmente, o calendário de reuniões ordinárias;
VIII – aprovar, anualmente, o relatório de suas atividades;
IX – aprovar o relatório final do plano de ações do Pacto Nacional de Prevenção aos Feminicídios;
X – aprovar a matriz de comunicação relacionada às ações governamentais e às ações do Pacto Nacional de Prevenção aos Feminicídios; e
XI – elaborar o seu regimento interno.
Parágrafo único. O regimento interno do Comitê Gestor será aprovado por meio de ato da Ministra de Estado das Mulheres.
Art. 7º O Comitê Gestor é composto por representantes dos seguintes órgãos:
I – um do Ministério das Mulheres, que o coordenará;
II – um da Casa Civil da Presidência da República;
III – um do Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome;
IV – um do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania;
V – um do Ministério da Educação;
VI – um do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos;
VII – um do Ministério da Igualdade Racial;
VIII – um do Ministério da Justiça e Segurança Pública;
IX – um do Ministério do Planejamento e Orçamento;
X – um do Ministério dos Povos Indígenas; e
XI – um do Ministério da Saúde.
§ 1º Cada membro do Comitê Gestor terá um suplente, que o substituirá em suas ausências e seus impedimentos.
§ 2º Os membros do Comitê Gestor e os respectivos suplentes serão indicados pelos titulares dos órgãos que representam e designados em ato da Ministra de Estado das Mulheres.
§ 3º A composição do Comitê Gestor terá por princípio a diversidade e observará a paridade de gênero e étnico-racial, e cada órgão participante indicará, no mínimo, uma mulher autodeclarada preta, parda, indígena, idosa, LBTQIA+ ou com deficiência, entre os membros titular e suplente, exceto em casos devidamente justificados.
§ 4º Os membros do Comitê Gestor serão ocupantes de Cargo Comissionado Executivo – CCE ou Função Comissionada Executiva – FCE equivalente ou superior ao nível 15 e deverão preferencialmente exercer as funções de Secretário-Executivo, Assessor Especial ou Secretário Nacional, em área de atuação relacionada à temática das ações constantes do Pacto Nacional de Prevenção aos Feminicídios.
Art. 8º O Comitê Gestor se reunirá, em caráter ordinário, bimestralmente e, em caráter extraordinário, mediante convocação de seu Coordenador.
§ 1º O quórum de reunião do Comitê Gestor é de maioria absoluta e o quórum de aprovação é de maioria simples.
§ 2º Na hipótese de empate, além do voto ordinário, o Coordenador do Comitê Gestor terá o voto de qualidade.
Art. 9º A Secretaria-Executiva do Comitê Gestor será exercida pela Secretaria Nacional de Enfrentamento à Violência contra Mulheres do Ministério das Mulheres.
Art. 10. É vedada a divulgação das discussões em curso no âmbito do Comitê Gestor sem a prévia anuência de seu Coordenador.
Art. 11. Os membros do Comitê Gestor que se encontrarem no Distrito Federal se reunirão presencialmente ou por videoconferência, nos termos do disposto no Decreto nº 10.416, de 7 de julho de 2020, e os membros que se encontrarem em outros entes federativos participarão da reunião por meio de videoconferência.
Art. 12. O Coordenador do Comitê Gestor poderá convidar especialistas e representantes de outros órgãos e entidades, públicos e privados, para participar de suas reuniões, sem direito a voto.
Art. 13. A participação no Comitê Gestor será considerada prestação de serviço público relevante, não remunerada.
Art. 14. O Pacto Nacional de Prevenção aos Feminicídios será implementado em articulação com os seguintes órgãos, entidades e Poderes, dentre outros:
I – Conselho Nacional dos Direitos da Mulher;
II – Conselho Nacional de Justiça;
III – Conselho Nacional do Ministério Público;
IV – Conselho Nacional das Defensoras e Defensores Públicos Gerais;
V – Defensoria Pública da União;
VI – Ordem dos Advogados do Brasil;
VII – Câmara dos Deputados;
VIII – Senado Federal;
IX – secretarias ou organismos responsáveis pelas políticas para mulheres dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios que aderirem ao Pacto Nacional de Prevenção aos Feminicídios;
X – colegiados de secretarias estaduais de segurança pública, de saúde, de assistência social, de educação e congêneres;
XI – organismos internacionais;
XII – instituições acadêmicas; e
XIII – organizações da sociedade civil.
CAPÍTULO IV
DISPOSIÇÕES FINAIS
Art. 15. Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão aderir ao Pacto Nacional de Prevenção aos Feminicídios por meio de instrumentos específicos a serem firmados com o Ministério das Mulheres, com os respectivos planos de ação, em consonância com as diretrizes, os objetivos e os princípios da Política Nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres e os eixos estruturantes do Pacto Nacional de Prevenção aos Feminicídios previstos neste Decreto.
§ 1º As secretarias estaduais, distrital ou municipais, ou o organismo responsável pelas políticas para as mulheres, serão os órgãos responsáveis pela coordenação do plano de ação em sua respectiva esfera de Governo, em diálogo e articulação com a Secretaria Nacional de Enfrentamento à Violência contra Mulheres do Ministério das Mulheres.
§ 2º As secretarias estaduais, distrital ou municipais, ou o organismo responsável pelas políticas para as mulheres, enviarão relatório semestral à Coordenação do Comitê Gestor para fins de monitoramento das ações do Pacto Nacional de Prevenção aos Feminicídios.
Art. 16. As despesas decorrentes da implementação do Pacto Nacional de Prevenção aos Feminicídios correrão à conta das dotações consignadas aos Ministérios responsáveis pelas ações previstas neste Decreto, respeitada a disponibilidade financeira e orçamentária.
Art. 17. O plano de ações do Pacto Nacional de Prevenção aos Feminicídios será elaborado no prazo de cento e vinte dias, contado da data de publicação deste Decreto, prorrogável por igual período.
Art. 18. O Pacto Nacional de Prevenção aos Feminicídios vigerá até 31 de dezembro de 2027.
Parágrafo único. O relatório final das atividades do Pacto Nacional de Prevenção aos Feminicídios será submetido pela Coordenação do Comitê Gestor à Ministra de Estado das Mulheres.
Art. 19. Fica revogado o Decreto nº 10.906, de 20 de dezembro de 2021.
Art. 20. Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 16 de agosto de 2023; 202º da Independência e 135º da República.
LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
Aparecida Gonçalves