Justiça condena C&A a pagar R$ 50 mil de danos morais após episódio de racismo

Jovem negro foi destratado e expulso da loja por verificar se blusa era do seu tamanho antes de comprar; empresa alegou que provas de roupa estavam proibidas devido à pandemia

A loja C&A, localizada em um dos shoppings de Maceió, foi condenada a pagar indenização de R$ 50 mil a adolescente negro que sofreu racismo no estabelecimento em agosto de 2020. Após tentar verificar se blusa era do seu tamanho antes de comprar, o jovem foi destratado e expulso do local. A decisão é do juiz Filipe Ferreira Munguba, da 6ª Vara Cível da Capital.

Ao analisar as declarações e as provas apresentadas no processo, o magistrado destacou que ficou demonstrado, de forma sobeja, a ocorrência de ato ilícito praticado pela empresa ré, que praticou atitude reprovável, violando os direitos da personalidade, tais como honra e dignidade.

Para Filipe Munguba, a conduta excessiva do funcionário da demandada ao proceder com tratamento discriminatório e vexatório não justifica o exercício regular de direito, mas sim atos abusivos caracterizadores de ilícitos.

“A abordagem do funcionário da empresa não foi realizada com a necessária urbanidade e discrição, tampouco cordialidade, notadamente porque as testemunhas relataram que tinham outras pessoas no estabelecimento comercial estavam realizando a prova de roupas e que estas não receberam tratamento ou advertência semelhante ao qual foi ofertado ao adolescente. Inclusive, testemunhas confirmaram que também provaram roupas naquele dia, pois era algo corriqueiro, sendo evidente a configuração do ato público discriminatório em face da parte demandante”, comentou o juiz.

Segundo o magistrado, a Constituição Federal traz, no inciso III do artigo 1º, que a dignidade humana é um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito, concedendo assim ao dano moral uma nova feição e maior dimensão, posto que a dignidade humana nada mais é do que a base de todos os valores morais, a essência de todos os direitos personalíssimos.

“Desse modo, suficiente a prova dos autos a corroborar os argumentos da parte autora e a justificar o dever indenizatório, nos termos dos artigos 186 e 927, ambos do Código Civil. Em contrapartida, a demandada não logrou êxito em comprovar fatos modificativos, extintivos ou impeditivos do direito da parte autora, ônus que lhe cabia e do qual não se desincumbiu, a teor do que estabelece o art. 333, II do Código de Processo Civil”, justificou Filipe Munguba.

Entenda o caso

De acordo com os autos, no dia 24 de agosto de 2020, a autora do processo foi ao shopping com seus quatro filhos, sendo três brancos e um negro, para fazer compras. Quando a mãe foi ao banheiro com o mais novo, os demais foram até à loja C&A.

No momento em que o adolescente negro, de 15 anos, estava aproximando uma blusa junto ao corpo para verificar se caberia foi abordado por um dos seguranças, que o destratou mandando largar a peça e sair da loja. O fiscal teria dito rudemente que experimentar roupas estava proibido, mas segundo testemunhas outras pessoas presentes na loja estavam vestindo as peças no meio da loja e sequer tinham sido orientadas a pararem.

Quando o irmão mais velho questionou a atitude, o segurança proferiu uma ofensa e ordenou que eles se retirassem do local. Diversas pessoas presenciaram a humilhação e o constrangimento sofrido pelo adolescente e sua família, formando uma aglomeração em frente à loja.

A acusação alegou que o segurança agiu com racismo, uma vez que todos os irmãos do autor eram brancos, e somente o adolescente negro foi abordado, constrangido e obrigado a se retirar da loja. Após o ocorrido, a mãe compareceu à Delegacia competente para registrar a ocorrência. Apesar disso, a empresa não tomou nenhuma medida e a autora procedeu com a denúncia na Comissão de Direitos Humanos.

Em sua defesa, a loja alegou que naquele período não era permitido que os clientes utilizassem os provadores e provassem roupas na área de vendas, que o estabelecimento dispunha de sinalizações que informavam que os provadores estavam fechados e que os trabalhadores da empresa tinham o dever de informar de modo cortês sobre a impossibilidade de provar as peças e que o prazo de troca foi estendido para 90 dias.

Uma testemunha do processo disse que viu a mãe bastante emocionada quando estavam sendo levados para fora do shopping pelos seguranças. Ele contou que conversou com a família e disse a eles que não deveriam ter sido expulsos, mas sim encaminhados para a administração do shopping para realizar uma reclamação contra a loja. Já outra testemunha disse que a família ficou muito nervosa porque em determinado momento um dos seguranças chegou a tocar no adolescente para que ele saísse do estabelecimento.

Matéria referente ao processo nº 0729205-04.2020.8.02.0001

TJAL

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