Uma trabalhadora que não foi efetivada depois do contrato de experiência por ter sido acusada de participar do homicídio do próprio filho, mesmo após a denúncia ser rejeitada pelo Judiciário, deverá ser indenizada. A decisão é da 4ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS), que manteve a sentença do primeiro grau.
De acordo com informações do processo, a trabalhadora foi admitida como vendedora por meio de contrato de experiência de 30 dias por uma empresa que presta serviços a uma operadora de telefonia. No final do período, foi dispensada sem justificativas, mas segundo alegou e também conforme os depoimentos trazidos ao processo, a causa foi o envolvimento dela na ação penal em que foi acusada de homicídio do próprio filho. Na ocasião, já havia sido publicada a decisão do Tribunal de Justiça que despronunciou a trabalhadora no caso, rejeitando a denúncia do Ministério Público.
No primeiro grau, a sentença frisou que o contrato de experiência é um contrato a prazo determinado e que, ao final do período estipulado, o empregador pode considerar a relação de trabalho extinta sem precisar esclarecer a razão. Isso, por si só, ressaltou o juiz, não é motivo para indenização por danos morais. No entanto, no caso analisado, o magistrado considerou o procedimento adotado pela empresa “absolutamente reprovável”, porque houve a propagação da mentira de que a trabalhadora havia participado do assassinato do próprio filho. A empregadora foi condenada a pagar uma indenização de R$ 10 mil à trabalhadora por danos morais.
A autora também havia pedido o pagamento dos salários que teria deixado de receber no período entre a dispensa e o ajuizamento da ação, com base na Lei nº 9.029/95, que proíbe práticas discriminatórias nas relações de emprego. Entretanto, o magistrado considerou que a situação vivenciada pela empregada não se enquadra nas hipóteses previstas pela norma.
Ao analisar o caso, a relatora do acórdão na 4ª Turma, desembargadora Ana Luiza Heineck Kruse, considerou que houve discriminação de gênero. A desembargadora observou que a acusação do Ministério Público ao ajuizar a ação penal contra a trabalhadora foi de que ela teria sido omissa ao deixar o filho de um ano em casa sozinho com o companheiro. “Já daí se observa que sequer se trataria de uma conduta ativa da reclamante para com o próprio filho”, observou a magistrada.
Além disso, a magistrada mencionou que, conforme a decisão do Tribunal de Justiça que despronunciou a trabalhadora, a acusação baseou-se apenas em depoimentos de pessoas que condenaram a mãe por não se portar dentro de um modelo de maternidade supostamente ideal. A desembargadora afirmou que esse mesmo olhar foi trazido para a relação de emprego, e que a não renovação do contrato da trabalhadora ocorreu porque “acreditou-se nos estereótipos e não nas decisões do Poder Judiciário”. Com essa fundamentação, deu provimento ao recurso da trabalhadora, acrescendo à condenação o pagamento da remuneração de dezesseis meses em dobro.
Contudo, o desembargador George Achutti, autor do voto prevalecente, manteve o entendimento da sentença do primeiro grau. O magistrado ressaltou que o caso analisado não se enquadra na Lei nº 9.029/95, que trata de prática discriminatória por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar, deficiência, reabilitação profissional, idade, entre outros. Ele destacou que as hipóteses previstas nessa lei são “dados objetivos que não se alinham com a situação vivenciada pela reclamante, dispensada em razão de notícias de que teria sido processada pela morte do próprio filho”. Com esse entendimento, negou o pedido da trabalhadora relativo aos salários que deixara de receber, mantendo apenas a indenização pelos danos morais. Seu voto foi acompanhado no julgamento pela juíza convocada Anita Job Lübbe.
As partes apresentaram recursos contra a decisão ao Tribunal Superior do Trabalho.
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