A 5ª Câmara do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, por decisão unânime, desobrigou a empresa Tri-Star Serviços Aeroportuários Ltda. do cumprimento da cota de pessoas com deficiência para o exercício da função de agente de proteção da aviação civil (APAC). A empresa poderá, no entanto, “firmar convênios com entidades beneficentes de assistência social para o preenchimento dos 100% da cota legal, sendo observado o prazo de 180 dias para a contratação e manutenção dos cargos das pessoas com deficiência”.
Inconformadas com a sentença do Juízo da 10ª Vara do Trabalho de Campinas, que julgou procedentes em parte os pedidos, recorreram as partes. Entre os motivos da empresa, a irresignação pela obrigatoriedade de contratação de pessoas com deficiência, e pelo pagamento de danos morais coletivos no valor de R$ 500 mil. Já o Ministério Público do Trabalho, como autor da ação, insistiu no programa de capacitação profissional e no dano moral coletivo.
O relator do acórdão, desembargador Samuel Hugo Lima, afirmou que o “cumprimento das cotas previstas no art. 93 da Lei 8.213/1991, por fazer parte de um contexto que garante a cidadania inclusiva às pessoas com deficiência, não pode ser relativizado, inclusive pela via da negociação coletiva”. Porém, ressaltou que “em hipóteses excepcionais analisadas restritivamente, essa contratação pode inviabilizar a atividade empresarial, o que se verifica em algumas atividades de apoio ao transporte aéreo previstas em normativos específicos”.
No entendimento firmado, diante de uma situação em que se confrontam, de um lado, o direito de candidatos com deficiência ao cumprimento da cota e, de outro, as vedações encontradas pelas empresas de prestação de serviços de apoio ao transporte aéreo previstas em normativos da Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC) relacionados à segurança aérea, “é preciso lançar mão dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade”, afirmaram os magistrados, que determinaram que a empresa poderá “cumprir a cota por intermédio de terceiros, conforme previsto subsidiariamente no art. 66 do Decreto 9.579/2018, com a redação dada pelo Decreto 11.479/2023, lá implementando todas as medidas para adaptação do ambiente de trabalho a esses empregados”.
O acórdão, consoante com o espírito constitucional de proteção do direito de inclusão das pessoas com deficiência ao mundo do trabalho (cidadania inclusiva), ressaltou a importância do tema proposto pelo Ministério Público do Trabalho, reforçando, mais de uma vez que, por ser uma garantia do cidadão com deficiência, “não há como se falar, de início, em relativização do direito”, e que, por impositivo legal, não é a pessoa com deficiência (PCD) que deve se adaptar ao ambiente de trabalho, mas o contrário, e por isso, “incumbe ao empregador tomar todas as medidas cabíveis para se adaptar ao recebimento do PCD, pois ‘adaptação razoável’ significa as modificações e os ajustes necessários e adequados que não acarretem ônus desproporcional ou indevido, quando requeridos em cada caso, a fim de assegurar que as pessoas com deficiência possam gozar ou exercer, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas, todos os direitos humanos e liberdades fundamentais”, segundo o texto da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, equivalente no país a emenda constitucional (CF, art. 5º, § 3º, acrescentado pela EC 45/2004).
O colegiado ressaltou, todavia, que a aplicação mecânica da lei “não pode levar a soluções que impliquem impossibilidade de concretização à livre iniciativa (art. 170 da Constituição Federal) ou risco à comunidade, exigindo do julgador a procura de soluções que, de um lado, garantam o direito ao cumprimento da cota, mas, de outro lado, não inviabilizem o exercício da atividade empresarial”.
O colegiado também justificou sua decisão com base em alegações da empresa sobre a realização de um rodízio entre as atividades dos agentes, com vistas à segurança desses trabalhadores e dos passageiros. Segundo o acórdão, os PCDs poderiam encontrar mais dificuldade para participar desse revezamento.
Danos morais coletivos
Sobre a decisão que excluiu a condenação ao pagamento dos danos morais coletivos, o colegiado justificou não ter havido nenhum prejuízo aos trabalhadores nem à sociedade, considerando-se que a empresa “contratou consultor a fim de verificar se seria possível observar a cota para contratação de PCDs”. Além disso, é uma prática da empresa a contratação de PCDs, o que se confirma pelas “várias pessoas portadoras de deficiência trabalhando em sua área administrativa”, afirmou o acórdão.
Por fim, segundo ficou comprovado nos autos, a própria empresa, “sopesando as situações a ela apresentadas, deu ênfase à segurança dos passageiros e dos próprios PCDs e apresentou uma série de alternativas a fim de que a cota pudesse ser cumprida por intermédio de terceiros”. O acórdão ressaltou, contudo, que “obviamente, a contratação por intermédio de terceiros não exime a reclamada de tomar todas as medidas para readaptação do local de trabalho a fim de possibilitar o trabalho decente por parte dos PCDs”.
Programa de capacitação profissional
Entre os pedidos do Ministério Público do Trabalho, julgado improcedente na primeira instância, estava o de impor à empresa elaboração e implementação de um programa gratuito de capacitação profissional, para que pessoas com deficiência da comunidade em geral tivessem possibilidade de fazer cursos e treinamentos para o ingresso nas cotas legais. O colegiado, em consonância com a sentença, não entendeu assim, e afirmou “não ser possível a condenação da ré para que ela implemente de forma gratuita esse tipo de programa de capacitação”, uma vez que “a obrigação legal das empresas é respeitar a cota legal para contratação das pessoas com deficiência e não a elaboração dos programas”.
O colegiado afirmou que a elaboração desses programas “seria uma atitude louvável das empresas”, mas salientou que “o poder público é que tem o dever de implementá-los, a fim de que as pessoas com deficiência ou trabalhadores reabilitados tenham condições de ingressar nas vagas a eles direcionadas”.
Processo nº 0011182-15.2018.5.15.0129
TRT15