Tribunal afasta prescrição e determina realização do Estudo do Componente Indígena em ação referente à construção da rodovia MT-170

Reconhecendo a imprescritibilidade dos danos ambientais causados em Terras Indígenas (TIs), a 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) determinou o retorno dos autos à instância de origem para que seja realizado o Estudo do Componente Indígena em ação suscitada pelo Ministério Público Federal (MPF) para averiguar irregularidades na construção da rodovia MT-170, no estado do Mato Grosso (MT).

Na primeira instância, o juízo monocrático havia julgado extinto o processo, com resolução do mérito, acolhendo a posição que defendia a prescrição dos danos ambientais avaliados no âmbito da ação civil pública n. 1002332-21.2020.4.01.3600.

Nessa ação civil pública, o MPF buscava a condenação da União, do Estado do Mato Grosso e do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT) em obrigação de fazer referente a sanar irregularidades apontadas nos processos de licenciamento da construção asfáltica da ródia MT-180, que liga Campo Novo do Parecis a Juína/MT em uma extensão de 120km.

Além disso, o MPF também pretendia a condenação das partes à obrigação de fazer um processo de consulta aos povos afetados pela obra e de indenizar os povos indígenas afetados pelos danos materiais e morais sofridos.

O relator do processo, desembargador federal Souza Prudente, ao votar pelo provimento da apelação do MPF para anular a decisão da primeira instância e determinar o retorno dos autos para produção da prova pericial requerida (o Estudo de Componente), salientou o papel da Corte do TRF1 em zelar por um meio ambiente ecologicamente equilibrado, e também pelos direitos indígenas.

Construção em Terras Indígenas – Segundo consta no relatório, a rodovia MT-170 tangencia a Terra Indígena Irantxe, e passa nas proximidades da TIs Utiariti, Tirecatinga, Menkü, Enawenê-Nawê e Erikbatsá. Essa proximidade da rodovia com os territórios indígenas era de conhecimento do órgão licenciador e também do órgão empreendedor, já que três dos estudos que subsidiaram as licenças para a construção apontaram ações para minimizar os impactos sobre a área durante a execução das obras.

No entanto, o MPF aduziu que nada direcionado às comunidades e aos impactos ambientais na área foi realizado, e argumentou no Tribunal que “a não realização dos estudos de componente indígena no processo de licenciamento ambiental e da consulta prévia, livre e informada sobre a afetação do território indígena, caracterizam sim omissão estatal cuja reparação é imprescritível”.

Imprescritibilidade dos danos ambientais em TIs – Ao votar, o desembargador federal Souza Prudente salientou que o licenciamento ambiental realizado está marcado por várias irregularidades, principalmente pela falta do Estudo de Componente Indígena. “Embora a rodovia já tenha sido construída, suas consequências em relação às terras indígenas persistem, a justificar eventuais medidas de cautela necessárias, a fim de evitar-se o agravamento desse dano ambiental”, pontuou o relator.

A área descrita nos autos, registrou ainda o magistrado, encontra-se situada nos limites da Amazônia Legal, patrimônio nacional, e, portanto, inserida em área de especial proteção ambiental. “A todo modo, em se tratando de defesa de meio ambiente, como direito humano e fundamento intergeracional das presentes e futuras gerações (CF, art. 225), a não se submeter às barreiras do tempo, não há que se cogitar de prazo prescricional nas ações administrativas e/ou criminais”, concluiu.

Por fim, o desembargador federal reforçou que, qualquer controvérsia envolvendo fiscalização do bioma correspondente à Amazônia Legal termina por ser trazida à análise do Tribunal, fazendo com que qualquer uma das decisões do TRF1 acerca do meio ambiente assuma considerável amplitude no contexto ecológico da biodiversidade global.

“A construção de rodovia não apenas atinge o meio ambiente, no qual estão inseridas as comunidades indígenas afetadas pela obra em referência, mas também alcança os direitos indígenas na medida em que pode comprometer o direito à terra indígena, imprescritível por se tratar de direito à vida, fundamental e essencial à afirmação dos povos”, acrescentou ainda.

A decisão do Colegiado, acompanhando o relator, foi unânime

Processo 1002332-21.2020.4.01.3600

AL

TRF1

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